Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
sábado, 11 de junho de 2011
2580) A FC da América Latina (11.6.2011)
Acabo de receber um exemplar de The Emergence of Latin American Science Fiction de Rachel Haywood Ferreira (Middletown: Wesleyan University Press, 2011), o mais recente título na crescente bibliografia de brasilianistas norte-americanos sobre a FC no Cone Sul. Rachel é professora na Iowa State University, e esteve no Brasil anos atrás entrevistando autores e pesquisadores da FC brasileira. Fez o mesmo em outros países, e seu estudo é um apanhado da FC praticada em nosso continente antes de 1920, ou seja, antes que o próprio termo “science fiction” fosse inventado. (Oficialmente, o termo surgiu em 1926, criado por Hugo Gernsback na revista Amazing Stories. No mesmo ano, Monteiro Lobato já estava publicando aqui O Choque – Romance do Choque das Raças na America no Anno de 2228, que atualmente tem o título de O Presidente Negro e voltou a ser discutido em função da eleição de Barack Obama.)
Qualquer estudo desse período mostra de maneira muito clara que a ficção científica de nosso continente não deriva dos “pulp magazines” norte-americanos pós-1926, mas dos chamados “romances científicos” europeus do século 19, tipicamente as obras de Julio Verne e H. G. Wells. Naquele tempo, era a Europa que nos colonizava culturalmente, que era contemplada e imitada pelos nossos literatos. Os EUA só a ultrapassaram após a II Guerra Mundial, quando a invasão foi maciça, e, ironicamente, não poupou sequer a debilitada Europa. Na história de qualquer país europeu, 1945 é um divisor de águas, é o momento em que Verne & Wells foram suplantados pela pulp fiction.
O livro de Rachel Haywood Ferreira refere obras brasileiras como Páginas da História do Brasil Escritas no Ano 2000 (folhetim, 1869-1872) de Joaquim Felício dos Santos, São Paulo no Ano 2000 (1909) de Godofredo Barnsley, Doutor Benignus (1875) de Augusto Emilio Zaluar, O Fim do Mundo (1856) de Joaquim Manuel de Macedo e “Demônios” (1893) de Aluísio Azevedo. São textos familiares aos pesquisadores brasileiros, embora praticamente desconhecidos pelo público leitor em geral. Creio que para nós a maior descoberta será a análise de RHF sobre autores de outros países, tais como Eduardo Ladislao Holmberg, Eduardo Ezcurra, Amado Nervo, Miguel Cané, Juana Manuel Gorriti, etc. Alguns, desconhecidos para nós; outros famosos, como é o caso de Leopoldo Lugones, mas sobre cuja obra de FC pouco sabemos.
O livro de RHF vem se somar a outros lançamentos recentes como Ficção Científica Brasileira de Elizabeth M. Ginway (São Paulo: Devir, 2005), Cosmos Latinos: an Anthology of Science Fiction from Latin America and Spain, editada por Andrea Bell e Yolanda Molina-Gavilán (Wesleyan University Press, 2005) e o brasileiro Ficção Científica, Fantasia e Horror no Brasil – 1875 a 1950 de Roberto de Sousa Causo (Editora UFMG, 2003). São as primeiras escavações em busca da pirâmide soterrada da literatura fantástica em nosso continente.
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