sexta-feira, 20 de maio de 2011

2561) As notícia tão errada (20.5.2011)



(Mário de Andrade, por Baptistão)

Tem causado polêmica o livro Por uma vida melhor de Heloísa Ramos, Ed. Global, em que supostamente o MEC estaria ajudando a destruir a língua portuguesa e prejudicando a alfabetização das crianças. É a campanha política de sempre, procurando más intenções nas menores coisas feitas pelo Governo. Acho um absurdo manchetes ou chamadas tipo “Livro usado pelo MEC ensina aluno a falar errado”. Não é isso, absolutamente. O livro, pelo que vi, faz o que eu faço nestas minhas colunas: defender a fala informal, coloquial, como uma maneira paralela de usar a língua, que pode muito bem conviver com a Norma Culta. Mas eu acho que todos lucraríamos se o enfoque político, mero pretexto para “meter o pau no Governo”, fosse substituído por um enfoque voltado para a língua portuguesa, que é o que está em questão. Eu critico todo Governo, mas neste caso os dois lados merecem críticas.

Diz a autora do livro: "O importante é chamar a atenção para o fato de que a ideia de correto e incorreto no uso da língua deve ser substituída pela ideia de uso da língua adequado e inadequado, dependendo da situação comunicativa". Concordo com isto, menos num detalhe, a expressão “substituída”. Não podemos perder a idéia de correto e incorreto, porque existem coisas que são flagrantemente incorretas. E não se pode dar a ninguém a impressão de que a Norma Culta da língua (que também defendo, consistentemente, nesta coluna) não serve para nada, e pode ser substituída pela norma coloquial, ao gosto do falante. (O livro não defende isto, claro. Mas os termos que usa abrem espaço para que alguém o acuse disto.)

Cada um fala do jeito que lhe apraz. Eu digo o tempo todo coisas como: “As pessoa pensa que a Gramática é um bicho de sete cabeça”. É assim que eu pronuncio as palavras quando estou falando, resíduo plebeu de quem foi criado em rua sem calçamento. Mas se eu for escrevê-las vou escrever como Camões escreveria, resíduo elitista de quem foi criado em casa com biblioteca. A não ser que eu esteja escrevendo, num romance ou numa peça, um diálogo de um personagem que fala assim. Então, tenho que escrever assim.

O livro tem a boa intenção de diminuir o enorme sentimento de culpa, de inadequação, de complexo de inferioridade, em milhões de alunos pobres que são escarnecidos diante da turma por terem escrito ou pronunciado uma palavra da única maneira que aprenderam, e que não é a da Norma Culta. O “preconceito linguístico” existe, e existe forte. Nosso dever é legitimar as falas coloquiais, regionais, etc., sem dar a impressão de que se está dispensando o ensino, o estudo e a prática da Norma Culta. A Norma Culta é a âncora da língua, que a mantém firme no centro de uma consciência coletiva e compartilhada. A Norma Culta evita que ela se estilhace em milhares de falares regionais ou, pior ainda, em milhões de indivíduos falando uma língua pessoal que só eles entendem.

7 comentários:

  1. sobre isto:

    CARLOS ARANHA
    http://shorttext.com/8yhw6f3e58p

    FELIX MARANGANHA
    http://ocalangoabstrato.blogspot.com/2011/05/contra-redoma-imutavel-do-erudito.html

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  2. concordo plenamente.

    Cada um fala do jeito que lhe apraz. Eu digo o tempo todo coisas como: “As pessoa pensa que a Gramática é um bicho de sete cabeça”. É assim que eu pronuncio as palavras quando estou falando, resíduo plebeu de quem foi criado em rua sem calçamento. Mas se eu for escrevê-las vou escrever como Camões escreveria, resíduo elitista de quem foi criado em casa com biblioteca.

    digo isso todo dia em minha aulas

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  3. Tá falando errado, Joaoletras. Não se diz "minha aulas", se diz "minhas aula". :-))

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  4. desculpa. foi presa na digitação.

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  5. eu falo mesmo é assim como você diz: "minhas aula"

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  6. Braulio,

    Concordo em grande parte com o seu texto. Porém, o meu maior receio é de que alguns, principalmente as crianças, possam não ter discernimento suficiente para ter essa noção sobre o que você escreveu e não preservar a norma culta.

    Abs.

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  7. Texto muito sensato, Braulio.
    Como estudante de Letras, eu estava sentido falta de alguma visão menos superficial e rasteira do assunto nos veículos de informação.

    Submeter uma coisa tão importante quanto o estudo da língua a joguetes políticos realmente não dá.

    Até onde vi, o livro apenas constata um fato da realidade, para a partir dali ensinar a norma culta.
    É óbvio que um livro didático do português não deixaria de ensinar a norma padrão vigente.

    Um abraço.

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