Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
quarta-feira, 3 de novembro de 2010
2391) Verso livre obrigatório (3.11.2010)
(Glauco Mattoso)
O poeta Glauco Mattoso publicou há pouco na revista eletrônica Cronópios (http://tinyurl.com/27ll855) um artigo cujo mero título já sugere volumes de texto: “Verso livre obrigatório versus forma fixa voluntária”.
Nesta cadeia verbal encravam-se inúmeras polêmicas travadas entre os poetas contemporâneos nas últimas décadas.
Polêmicas desnecessárias, porque baseadas em equívocos, falácias, mal-entendidos; mas importantes, pois revelam a espantosa variedade de usos que a poesia tem para esses indivíduos.
Essa poesia aparentemente tão imprestável, chamada por Paulo Leminski, com ironia e carinho, de “inutensílio”.
Tudo começou quando o Parnasianismo era um governo comodamente refestelado nas poltronas do poder literário. Entre os parnasianos, vigorava a rima, a métrica, a estrofe regular, o poema como um conjunto de formas fixas que era preciso preencher com palavras, tendo cuidado para que não houvesse sequer uma sílaba tônica fora do lugar, sob pena de fazer desmoronar a estrutura inteira.
O Modernismo irrompeu janela adentro e jogou na lareira o regimento interno. Agora podia tudo. Verso sem rima, verso de qualquer tamanho, linguagem errada das ruas, regionalismos, barbarismos, poema de qualquer jeito, poema falando de qualquer coisa.
Isto acendeu uma luz de esperança nos olhos de inúmeros sujeitos doidos para ser poetas, mas sem muito traquejo para manejar as formas. Era um pouco como o que ocorreu depois no punk rock.
Os rapazes não conheciam as notas, nem as cordas, nem os acordes; mas morriam de vontade de subir no palco, dar aqueles pulos, aqueles gritos. A estética punk bradou: Pode tudo agora! E abriu-se uma cadabra que até hoje não voltou a se fechar.
Glauco Mattoso questiona o fato de muitos poetas de hoje rejeitarem as regras de versificação, e não apenas as rejeitarem para si próprios (um direito de qualquer um), mas afirmarem categoricamente que essas regras devem ser extintas e que não se aplicam mais à produção da poesia. Diz Glauco, em sua peculiar ortografia:
"As ultimas gerações litterarias se accommodaram na desculpa de que, tendo as modernas tendencias ‘abolido’ as formas fixas, todos os poetas estariam automaticamente desobrigados de dominar e até de conhecer regras de versificação. Sempre admirei auctores iconoclastas que ousaram transgredir valores vigentes, como Mario e Oswald no modernismo ou Augusto e Haroldo no concretismo, para não fallar na constante inquietação creativa de Bandeira e Drummond. Mas, quando reaffirmo que lhes applaudo a coragem e a irreverencia, é justamente por saber a que poncto conhecem, elles todos, cada norma que se propuzeram a contestar. Quando quizeram, tanto Mario como Augusto compuzeram impeccaveis sonetos, e só não os fizeram em quantidade porque estavam interessados em outras alternativas estheticas.”
Não se deve, diz ele, romper com a monotonia da regra para inaugurar a monotonia da quebra.
Exatamente, há uma semana, estou fazendo uma minuciosa leitura da "Conferência POESIA E COMPOSIÇÃO pronunciada na Biblioteca de São Paulo, 1952.
ResponderExcluirOps!
ResponderExcluirDo JOÃO CABRAL DE MELO NETO, obra completa, Editora Nova Aguilar, págs. 721-737.
Mas o que seria dos outsiders? Desse jeito,os pintores naifs teriam que ser capazes de pintar quadros academicos e os punks teriam que tocar violão clássico para só depois transgredir.
ResponderExcluirKadum todos os textos em prosa de Cabral, nesse volume, são excelentes.
ResponderExcluirMario: a idéia não é essa. A ideia é liberar o estudo das técnicas para aqueles que têm uma propensão natural para o estudo das técnicas (eu sou um). Seria injusto impor de cima para baixo a ideia de que a técnica acabou. O punk é livre para ser punk, o que não pode é exigir o fechamento dos Conservatórios de música, e assim por diante. A poesia marginal dos anos 1970 e o Concretismo disseram horrores do verso metrificado, do soneto, etc. Muitos jovens que tinham vocação para verso metrificado devem ter abandonado a poesia, porque nem sabiam fazer poeminha-piada nem poema visual.
ResponderExcluirtolice de alguns pensar que o verso chamado livre é moderno e o metrificado antigo
ResponderExcluirambos vêm de tradições milenares que possivelmente não poderemos determinar o início
assim como a chamada poesia concreta e a visual que têm antecedentes também milenares
pra onde quer que se olhe se encontra o passado
a medida do verso livre não é a medida do soneto, mas tem lá suas medidas. com medida ou sem medida, o que vale é se o poema tem qualidade tanto na sua forma quanto no seu conteúdo, um está ligado ao outro.além disso, há momentos que a forma mais rígida prevaleceu, como foi o caso do parnasianismo, outras vezes outras medidas ganharam espaço, como foi no primeiro momento do modernismo brasileiro. mas vejma vcs o quanto tem de medida a poesia de João Cabral, mas nem por isso ele foi considerado um poeta passadista, 45, ou qualquer coisa que valha, mas nem por isso os poetas contemporâneos devem seguir a forma cabralina, nem o Glauco deve deixar os seus sonetos de lado, nem os leminskianos a irreverência do haikai abrasileirado. mário
ResponderExcluirEu tinha pensado o mesmo.
ResponderExcluirTem poucos poetas de verdade, muito poucos...