terça-feira, 6 de julho de 2010

2237) O Woodstock do futebol (9.5.2010)



Faltam não sei quantos dias para a Copa do Mundo! É a contagem regressiva do Globo Esporte, programa com o qual tenho uma relação parecida com a que certos débeis mentais têm com o “Big Brother Brasil”. Fazer o quê? O futebol nivela todo mundo a um nível meio primata de ser, o que é uma boa coisa, pelo menos para gente que vive lendo livros de metafísica e semiótica. Não custa nada lembrar de vez em quando que os nossos antepassados viviam brigando por causa de um coco. Correr atrás de uma bola nos leva de volta à infância da espécie.

A Copa é uma espécie de Woodstock no futebol. Woodstock foi o primeiro festival onde amanhecia, anoitecia, era um show atrás do outro, o sujeito adormecia durante um show de Santana e acordava num show de Jimi Hendrix, adormecia de novo num show de Joe Cocker e acordava num do Ten Years After... Copa do Mundo é tipo isso, são três jogos por dia e mesmo quando jogam times menores sempre existe a expectativa de um grande gol, uma grande jogada, que ganham dimensão ainda maior quando pensamos nos bilhões de pessoas que estão vendo aquilo. E quando pensamos que os jogadores sabem disso. Para eles, é sempre um tudo ou nada, e há casos incontáveis de jogadores de países obscuros que se consagraram porque fizeram numa Copa um grande gol, uma grande defesa, e entraram para a História. Pelo fato de ser vista por bilhões de pessoas e reproduzida pela imprensa de centenas de países, a Copa não registra somente o craque, mas todo aquele que consegue ter ali um momento de craque.

Não sei se alguém aí fora ainda lembra dos nomes de Boniek, Schilacci, Butragueño, Petras, Kempes, Masopust, Lato, Torres... São jogadores que tiveram seus 15 minutos de Pelé, coisa que qualquer um tem. Até eu já devo ter tido, quando jogava no “campinho das barreiras”. Até Maradona já teve 15 minutos de Pelé; o difícil é continuar sendo Pelé a vida toda. A Copa do Mundo pega os 15 minutos desses Zés-das-Couves e os amplifica, repercute, desenvolve, faz o mundo inteiro sentir-se aos pés do sujeito (ou melhor, faz o sujeito sentir-se como se o mundo estivesse aos pés dele). Depois, fumaça.

Mas onde há fumaça é porque já houve fogo, e quem viveu um momento de glória verdadeira tem o que guardar pro resto da vida. Os colecionadores de Copas, como eu, guardam momentos mágicos de cidadãos que nem sei se ainda estão vivos. De quatro em quatro anos o futebol promove um festival gigantesco em que depois do show da superbanda com centenas de milhões de discos vendidos vai subir ao palco um cabeludo sozinho com voz roufenha e violão de aço, e vai arrebatar a multidão. É aquele momento em que a energia da platéia parece passar através daquele filamento de gente que brilha no palco, tornando-o incandescente e imortal. Assim é o futebol na Copa, quando até um menino negro de 17 anos pode revelar que já é o Maior Jogador do Mundo.

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