Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
domingo, 27 de junho de 2010
2198) “O que fazer em caso de incêndio” (25.3.2010)
Este filme alemão dirigido por Gregor Schnitzler em 2001 (Was tun, wenn’s brennt?) conta a história de um grupo de anarquistas berlinenses que, depois da queda do Muro de Berlim, se deixa absorver e cooptar (este era o verbo usado pela esquerda aqui no Brasil, no tempo da ditadura) pelo Capitalismo triunfante. Um deles vira publicitário, outro advogado, uma vira socialite, a outra mãe de família... Somente dois deles continuam vestindo casacos de couro, hirsutos, radicais, vociferantes, morando em invasões urbanas (um deles anda em cadeira de rodas, o amigo lhe serve de anjo-da-guarda).
Acontece que eles tinham colocado uma bomba num prédio, e por defeito técnico a bomba não explodiu. Doze anos depois, explode por acaso. A polícia dá uma batida no apartamento dos dois malucos e confisca latas e mais latas de cinema underground feito por eles. E no meio das latas, existe uma mostrando o preparo e a instalação da bomba. O resto do filme mostra os dois recorrendo aos amigos aburguesados para tentar reaver (ou destruir) o filme que incrimina a todos – e de maneira especial aos que agora “se passaram para o lado do inimigo”.
Desde sua sequência inicial o filme se assemelha ao Watchmen recentemente dirigido (2009) por Zack Snyder. Em ambos, o mesmo tema da “volta dos que não foram”, ou seja, o retorno de um grupo de ativistas que na verdade nunca foi realmente extinto. Em ambos, a sequência inicial de apresentação dos créditos resumindo a situação para que o filme propriamente dito comece em seguida (em Incêndio, a preparação da bomba; em Watchmen, o triunfo dos governos de extrema direita nos EUA). Em ambos, os conflitos internos de ativistas políticos e sua dificuldade de sobreviver num país em que o Capitalismo ganhou a guerra política.
Mais curiosas do que as semelhanças, no entanto, são as diferenças entre os dois filmes. Watchmen, apesar de escrito por Alan Moore, um autor de ácidas HQs, não deixa de ser um super-espetáculo comercial. Entra no mercado como um “filme de super-heróis” destinado a grandes bilheterias e com foco nos adolescentes de todas as idades. O filme alemão parecia ser (pelo menos para mim) uma produção mais modesta porém mais independente, uma avaliação política de uma situação política.
Na prática é o contrário, e curiosamente Watchmen é o mais político dos dois. O filme de Schnitzler, apesar de simpático e bem realizado, parece um filme norte-americano pelos clichês que emprega, como a tipificação dos ex-revolucionários, e pela altíssima improbabilidade dos atentados, fugas, arrombamentos, infiltrações e escapadas do grupo. Tudo acontece com uma facilidade digna de seriados da Sessão da Tarde. A guerra da esquerda alemã já está servindo para gerar histórias de entretenimento sem compromisso. Se os revolucionários se dão bem no final do filme, é porque o filme é uma vitória do cinema capitalista de entretenimento.
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