terça-feira, 25 de maio de 2010

2074) “The Graveyard Book” (31.10.2009)




Este livro de Neil Gaiman andou ganhando prêmios importantes (Hugo, Locus, Newbery) e se não me engano é o seu primeiro romance para “jovens adultos” (um termo inglês que acho preferível a “infanto-juvenil”) depois do ótimo Coraline, que resultou inclusive num bom filme.

The Graveyard Book, ambientado numa cidade inglesa qualquer, começa com a chacina noturna de uma família inteira: pai, mãe e filha pequena. Há um bebê de um ano e meio que, por distração do criminoso e conveniência do autor, sai do berço ao ouvir o barulho, caminha pela casa, vê a porta da frente aberta e sai caminhando na direção do cemitério que fica na esquina. Ali é acolhido pelos fantasmas dos mortos, que o protegem do assassino no momento em que este, precisando “terminar o serviço” segue o bebê até o Campo Santo. O garoto recebe o nome de Nobody Owens e daí em diante é criado pelos fantasmas.

Neil Gaiman é uma espécie de Stephen King com todas as qualidades deste e sem alguns dos defeitos (a morbidez excessiva, e alguns recursos de enredo muito “crus” herdados da pulp fiction). The Graveyard Book é a crônica do crescimento de Nobody Owens, ou “Bod” e das aventuras que ele vive no cemitério e fora dele.

Gaiman afirma ter se inspirado no Livro da Jângal de Kipling, a história de Mowgli, o menino criado na floresta pelos lobos. Isto não me ocorreu durante a leitura, mas, em retrospecto, dá para ver as semelhanças. Em Kipling, temos uma humanização dos animais, cujas emoções e valores morais são semelhantes aos nossos. No Graveyard Book todos os fantasmas são humanos, mas são de épocas diferentes: do tempo dos celtas, dos romanos, da Idade Média, etc.

O mundo de Neil Gaiman tem uma linha direta de diálogo com os contos de Ray Bradbury em obras como O País de Outubro e Uma Estranha Família. Não são propriamente histórias de terror, porque seu objetivo não é aterrorizar. São crônicas nostálgicas, humorísticas, ou emotivas, que têm lugar em ambientes ocupados por fantasmas, vampiros, ogres, lobisomens, etc. Como as obras de Bradbury, as de Neil Gaiman podem ser lidas tanto por garotos quanto por adultos, pela finura de sua observação, pela simplicidade e elegância do estilo, pela imaginação incessante que desencava surpresas a toda hora.

Outro paralelo que pode ser feito é com os filmes de Tim Burton, principalmente Edward Mãos de Tesoura, Beetlejuice, O Estranho Mundo de Jack e A Noiva Cadáver. Gaiman e Burton compartilham essa zona crepuscular da imaginação em que crianças convivem com medo mas sem traumas por entre esqueletos, vampiros, bruxas, lobisomens, fantasmas.

Ninguém é tão vulnerável ao terror quanto uma criança, para quem tudo é real e qualquer coisa é possível. Não há crianças cientistas, marxistas, agnósticas. Toda criança é um homem primitivo para quem um cemitério é um lugar tão fervilhante de vida quanto a rua por onde caminha, a escola onde estuda. Toda criança é uma casa mal assombrada.





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