Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
sexta-feira, 9 de abril de 2010
1891) Poe: “O Embuste do Balão” (1.4.2009)
(gravura de Odilon Redon)
O conto de Edgar Allan Poe “O Embuste do Balão” (“The Balloon-Hoax”), apesar de se apresentar sob este título, contou com a credulidade de milhares de leitores. O texto noticiava a primeira travessia do Atlântico num balão, levada a efeito em três dias por um grupo de europeus. Publicado em 1844, era uma tentativa de Poe de repetir o sucesso de sua “Aventura sem par de Hans Pfaall” de 1835. Apesar do título se auto-denunciar, o início do conto era em forma de manchete com letras enormes, que logo atraíam a atenção dos leitores: “Notícias espantosas e urgentes, via Norfolk! O Atlântico atravessado em três dias! Triunfo notável da máquina voadora de Mr. Monck Mason! Chegada à ilha de Sullivan, perto de Charleston, dos srs. Mason, Robert Holland, Henson, Harrison Ainsworth e de outras quatro pessoas, no balão dirigível ‘Victoria’, depois de uma travessia de 65 horas de um continente a outro! Relato detalhado da viagem!”
O toque de plausibilidade era dado pela lista dos viajantes. Mason, Holland e Henson eram aeronautas famosos da época, e volta e meia a imprensa noticiava suas excursões em balões na Europa. Ainsworth era um conhecido escritor inglês, discípulo de Walter Scott. O texto de Poe descreve com detalhes o modelo do balão, seu modo de ascensão e descida, e depois finge transcrever textos de um diário de bordo mantido pelos viajantes. No final, diz Poe: “Esta é sem dúvida a empreitada mais estupenda, mais interessante e a mais importante já levada a efeito ou mesmo tentada pelo homem. Quanto aos acontecimentos magníficos que deverão se suceder agora, seria inútil tentar prevê-los”.
Seria difícil imaginar, hoje, alguém fazendo na imprensa um embuste – uma brincadeira de 1o. de abril, digamos – em torno de uma façanha proporcional a esta – uma nova viagem tripulada à Lua, por exemplo, ou quem sabe o desembarque de alienígenas. Na época da imprensa escrita, quando se disseminava uma notícia falsa, mas de grande repercussão, era preciso algum tempo até que os desmentidos alcançassem a mesma difusão, e nada garantia que isto acontecesse. Hoje, com a comunicação praticamente instantânea, mas interligada, rádios e TVs vigiam-se umas às outras e é muito difícil divulgar uma mentira bombástica sem que ela seja imediatamente investigada e desmentida pelos concorrentes.
Os embustes de nossa época são os embustes sutis, discretos, que vão crescendo na sombra e nos interstícios. São mitos como o da Área 51 (onde teria caído um disco voador), ou da encenação, por parte dos norte-americanos, do pouso da Apollo 11 na Lua, o qual na verdade não teria ocorrido. No tempo de Poe, e até mais recentemente, como no episódio da Guerra dos Mundos de Orson Welles, pelo rádio, era possível um ataque frontal à credulidade do público. Hoje, esse ataque é feito “pelas beiradas”, com as famosas Teorias da Conspiração, em que alguém nos “revela” fatos bombásticos e extraordinários a meia-voz, pedindo segredo.
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