sábado, 6 de fevereiro de 2010

1619) “I Semana do Cangaço” (21.5.2008)



Realiza-se a partir de 4 de junho, em Aracaju, a I Semana do Cangaço, com oficinas, palestras e exposições sobre o Cangaço nordestino. (Informações: www.semanadocangaco.blogspot.com). A data foi escolhida em comemoração ao aniversário de Lampião, e 2008 marca os 70 anos da morte do bandoleiro e de sua mulher Maria Bonita, assassinados pela polícia numa gruta em Angicos.

O cangaço ainda é um fenômeno contraditório. Para uma parte do Brasil, os cangaceiros eram meros criminosos, não se distinguindo muito dos traficantes de drogas de hoje em dia. Havia a diferença (essencial, temos que reconhecer) de que não traficavam drogas, mas de resto seu perfil era semelhante: aliavam-se à população desassistida, tinham mais mobilidade e melhor armamento do que as tropas do governo, impunham um sistema paralelo de justiça baseado nas armas, e nas venetas pessoais de seus líderes. Para muitos nordestinos, contudo, a imagem do cangaço não está associada ao crime nem à crueldade, e sim à coragem pessoal, à rebeldia, à luta contra os poderosos, à independência individual. Uma parte da intelectualidade de esquerda chegou a compará-los, com insistência, aos guerrilheiros revolucionários de muitos países latino-americanos. É um caso típico de uma Lenda Heróica que idealiza um fenômeno humano contraditório e trágico. Como qualquer herói de qualquer civilização.

Um dos melhores livros sobre o cangaço (para alguns, o melhor de todos) é Guerreiros do Sol, de Frederico Pernambucano de Melo (Ed. Girafa). Entre numerosos outros aspectos, a rica análise de FPM propõe uma distinção entre o que ele chama de “cangaço de vingança” e “cangaço meio-de-vida”. Nos filmes, romances e cordéis o cangaceiro é geralmente alguém que entra para o banditismo para vingar um crime contra sua família, crime que a Justiça da época (manipulada pelos poderosos) deixara impune. FPM observa o fato de que, enquanto alguns cangaceiros abandonam o cangaço logo após a consecução dessa vingança, outros permanecem nele por considerar que estão muito melhor assim do que na vida anterior. E existem casos de vinganças que são longamente proteladas, como se o cangaceiro preferisse poupar o desafeto para poder adiar indefinidamente o momento de largar a vida aventurosa e retornar (caso isso fosse possível) à vida pacata de vaqueiro ou lavrador.

Alguém dirá: “Mas quem diabo preferiria viver caçado à bala, correndo pelas caatingas, sujeito a traições, emboscadas, etc., em vez de viver tranqüilo e em paz?” A resposta é complexa, mas assim como existe gente pacata (como eu), existe gente que gosta de se envolver em situações violentas e perigosas, pela “adrenalina” que elas produzem. Além do mais, FPM lembra que o cangaço bem administrado (roubos, proteção de coronéis, etc.) podia ser lucrativo, e proporcionava poder, notoriedade, fama e ganhos patrimoniais, no contexto de “uma sociedade economicamente estagnada e de baixa mobilidade vertical”.

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