segunda-feira, 2 de novembro de 2009

1344) O Gráfico Amador (5.7.2007)




Entre 1954 e 1961, um grupo de jovens recifenses criou uma pequena editora para imprimir seus próprios livros. Recife não tinha uma editora profissional de livros; quem quisesse publicar suas obras tinha que recorrer ao Rio e São Paulo. Os rapazes eram cultos, bem informados, interessavam-se por literatura e pelas artes gráficas. Dispunham de algum dinheiro. Compraram impressoras manuais, conjuntos de tipos (fontes) e passaram a produzir seus próprios livros, todos eles com grande inventividade gráfica e bom conteúdo literário. Os rapazes chamavam-se Aloísio Magalhães, Orlando da Costa Ferreira, José Laurenio de Melo e Gastão de Holanda.

A história detalhada desta aventura está contada em O Gráfico Amador: As Origens da Moderna Tipografia Brasileira de Guilherme Cunha Lima (Rio: UFRJ, 1997). O Gráfico Amador tinha sócios pelo Brasil, que contribuíam com uma mensalidade e recebiam exemplares das obras, produzidas sempre em tiragens de alguns centenas ou até mesmo dezenas de exemplares. João Cabral de Melo Neto e Ariano Suassuna foram alguns dos que freqüentavam o grupo e publicaram através dele suas obras (Cabral sempre foi um experimentador com as artes gráficas, tendo sua própria gráfica artesanal quando morou na Espanha).

O livro registra minuciosamente todos os títulos publicados pelo O Gráfico Amador em seus sete anos de existência, livrinhos que hoje são raridades e podem valer muito (se encontrar algum deles, caro leitor, entesoure-o; é melhor investimento do que comprar dólar). Ao que parece, não existe nenhuma coleção completa destes títulos; a pesquisa foi feita reunindo os exemplares das coleções de José Mindlin, Paulo Bruscky, Jorge Martins e do próprio autor do livro.

O que O Gráfico Amador fez durante este período poderia ser chamado, sem intenção pejorativa, de “cordel de rico”. Ou seja, uma solução artesanal para veicular textos literários que as editoras profissionais não se interessavam em publicar. O grupo não tinha intenções de lucro: apesar de profissionalíssimo em termos de conhecimento técnico e sofisticação estética, era amador mesmo, no que se refere a lucro. Imprimia apenas a quantidade que conseguia distribuir.

No mesmo Recife onde apareceu na década de 1890 a indústria do cordel popular de Leandro Gomes de Barros surgiu na década de 1950 este grupo. Duas iniciativas parecidas e diferentes. O cordel popular de Leandro surgiu para dar vazão aos poemas orais e “versos de traslado” que circulavam no Nordeste, decorados ou em cópias feitas à mão. Aos poucos, a existência do veículo aumentou a produção literária, e foi criada uma verdadeira indústria subterrânea do verso popular, à margem das grandes editoras. O “cordel de rico” do Gráfico Amador era feito por amor à arte, e nunca teve, ao que parece, a finalidade de proporcionar sustento aos que o faziam, tanto é assim que o grupo se desfez à medida que seus integrantes foram avançando na carreira profissional.





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