Escrevi aqui (“A romaria de Romário”, 6 de fevereiro) sobre a campanha do grande Baixinho rumo ao seu milésimo gol. Tudo estava bem encaminhado. Romário marcou 9 gols em apenas 3 jogos, contando até (ninguém me convence do contrário) com uma pequena colaboração dos juízes (marcando pênaltis e mais pênaltis) e de alguns goleiros que iam nas bolas sem muita convicção, em jogos cujo resultado já estava definido, e um gol a mais não faria diferença.
Quando ele atingiu o 998, o Rio de Janeiro (cidade movida a marketing) se mobilizou inteiro para o milésimo. Quem não mora na cidade não tem a proporção da coisa; ouve o alarido das tevês e das rádios, mas ouve à distância. Num dos jogos em que ele poderia ter o feito o Gol Mil, saí passeando pelas ruas do bairro do Flamengo, num domingo às seis da tarde, e onde houvesse um TV ligada as calçadas estavam cheias de cadeiras, e de gente em pé, assistindo e esperando. E não eram apenas os futeboleiros habituais. Vi famílias inteiras, o cara levando a mulher, os filhos pequenos sentados no colo... Tudo isto para quê? Para um dia o menino dizer, aos cinqüenta anos: “Eu vi o gol mil do Romário”.
Por enquanto ninguém viu ainda, e eu culpo o próprio Baixinho. Na semana que antecedeu o jogo Vasco x Flamengo, quando ele tinha 998, o “Globo Esporte” descobriu um gol que a equipe dele não tinha computado, o que elevaria o número para 999. Marrento, ele recusou e devolveu o presente: “Fica de lambuja”, disse ele ao microfone. No domingo, o Vasco deu uma sapatada de 3x0 no Flamengo, e ele fez o terceiro gol, um golaço. Tivesse aceito o gol recém-descoberto, aquele teria sido o Gol Mil, e era um gol para entrar na História, o terceiro de uma vitória esmagadora sobre o maior rival. Haveria flashes espoucando até agora.
Mas não quis. Não quis, e daí em diante, como dizem os jogadores, “a bola não quis mais entrar”. Jogos e mais jogos sem nada acontecer, inclusive este último Vasco 4x4 Botafogo, em que durante os 90 minutos Romário ficou com a bola (segundo a TV-Globo) exatamente 10 segundos, o tempo de driblar um zagueiro e chutar por cima do gol. O Vasco perdeu nos pênaltis, caiu fora do Campeonato, e a equipe de produção do Baixinho ficou com uma festa adiada nas mãos. Pior são os técnicos de marketing dizendo cobras-e-lagartos dele, dizendo que o rapaz amarelou. Pois é, agora, só em maio.
Quando vocês revirem os gols e as jogadas fantásticas de Pelé na Copa de 70 (o chute a gol do meio de campo, o drible de corpo no goleiro uruguaio, o salto de dois metros para cabecear contra o gol da Itália) lembrem que aquele cara tinha 29 anos e mil gols no currículo. Estava num clímax que ninguém jamais igualou. Romário merece fazer mil gols, e até mais. O que não merece é passar por um sofrimento tão grande. O peso do marketing está sendo excessivo para um cara que tem 41 anos em cada panturrilha.
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