segunda-feira, 7 de setembro de 2009

1252) O roteirista e o diretor (18.3.2007)



(Guillermo Arriaga)

A imprensa tem debatido o recente arranca-rabo entre o diretor mexicano Alejandro González Iñarritu e o seu roteirista Guillermo Arriaga. A dupla fez três filmes em parceria: Amores Brutos (que vi e achei excelente), 21 gramas e Babel. Ao que parece, romperam porque Iñarritu achou que o roteirista estava aparecendo demais, dizendo-se co-autor dos filmes, etc. e tal.

Já vi este filme antes. Foi escrito pelo mesmo roteirista, que se chama “Vanity Fair”. É a mesma pinimba que separou Hitchcock do ótimo e hoje esquecido John Michael Hayes, que em apenas três anos de parceria escreveu para o mestre Janela Indiscreta, Ladrão de Casaca, O Terceiro Tiro e O Homem que Sabia Demais, Hayes não era o autor das histórias originais (todos os filmes foram adaptados de contos ou romances alheios). Mas conhecia a cabeça e o método de trabalho de Hitchcock, e colocava no papel coisas que certamente deixavam o diretor “se coçando” para entrar no estúdio e começar a rodar.

Para mim, um filme é do diretor, para o bem ou para o mal. É ele quem faz o filme prestar ou não. No chamado “cinema de autor”, que foi entronizado nos anos 1960, o roteirista era apenas um talento a mais contribuindo para concretizar a visão do diretor. Não lembro de casos, no chamado “cinema de arte”, de roteiristas que impusessem sua “visão” a um diretor, de diretores que se limitassem a cumprir obedientemente o que o roteirista tinha escrito. Essa obediência do diretor ocorria, ironicamente, dentro do esquema industrial de Hollywood, em que muitos diretores filmavam de forma escrupulosa e burocrática o que tinha sido colocado no papel, sem ousar mexer uma linha de diálogo. Isto significava uma ditadura dos roteiristas? De jeito nenhum: os próprios roteiristas trabalhavam com o Produtor, este sim, o chefão onipresente, olhando por cima do seu ombro. É o chamado “cinema de produtor”, em que o dono do filme contrata A para escrever, contrata B para dirigir, e quem não o fizer de acordo com sua vontade é substituído.

No cinema de autor, o roteirista levanta a bola para o diretor cortar. Dá o passe. Faz a assistência. Como no esporte, sua função é essencial; mas quem faz a jogada decisiva é o outro. Roteirista algum pode prever e redigir tudo que aparece na imagem, tudo que acontece num filme. Desempenho dos atores, jogos de luz e cores da fotografia, adequação de cenários e figurinos... Ele pode sugerir, mas não cria. Cabe a ele a primeira, mais humilde e mais essencial das funções: contar uma boa história. Cabe ao diretor filmar imagens que, além do valor-em-si que terão como imagens, consigam contar a mesma história que o roteirista contou em palavras. O melhor roteirista não é o cara que escreve bem, não é o bom escritor. O melhor roteirista é o cara que pensa em forma de imagens luminosas em movimento, mas não sabe ou não consegue filmá-las. O melhor roteirista é o diretor frustrado.


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