quinta-feira, 28 de maio de 2009

1053) Caminhando pelo convés (1.8.2006)



Ano de eleições presidenciais é sempre aquela ocasião em que a gente se pergunta se aquilo tudo vale a pena. Se vale o esforço de tomar banho, trocar de roupa, pentear o cabelo, pegar o ônibus, esperar na fila, entregar o título, ir para a cabine, gastar a tinta de um X – ou, mais modernamente, apertar aqueles botõezinhos da urna eletrônica, pegar o ônibus de volta e imaginar que com isto contribuiu para mudar o rumo da História. Dizem os entusiastas da Democracia Republicana que toda eleição é ganha por um voto, e os milhões restantes são desnecessários e redundantes. Tem sua lógica, mas não resolve o problema, porque os votos não são assinados, e ninguém pode me provar que o voto decisivo foi o meu.

Por que esse desalento? Dizem por aí que não adianta votar, porque todo político é desonesto. Eu não acho. Conheço pessoalmente um grande número de políticos, de vários Partidos e tendências, em cuja honestidade pessoal acredito. Não acho que os políticos brasileiros sejam mais desonestos do que, por exemplo, nossos industriais, nossos artistas, nossos banqueiros, nossos futebolistas, nossos policiais, nossos jornalistas, nossos fazendeiros. Mesmo os que roubam, não devem roubar o tempo inteiro. Na hora do aperto, cada qual puxa a brasa mais para perto de sua sardinha, procurando não exagerar para não dar na vista. Cada qual mexe os pauzinhos que tem à disposição; cada qual pega o telefone, ativa seus contatos, tece com sua voz e sua influência mais uma dúzia de fios numa imensa teia de interesses, uma teia tão complexa que cada um deles julga estar no centro. Nem sempre há uma relação direta entre um telefonema para Fulano e um dinheiro que pinga na conta. Dá tempo suficiente do cara se convencer de que uma coisa não teve nada a ver com a outra.

Este ano, vamos trocar de Presidente, de novo. Adianta? Não sei. É como trocar o capitão de um transatlântico, sendo que a tripulação anterior permanece, e a empresa dona do navio é a mesma. Na Democracia Republicana, manda quem pode, e obedecem os Presidentes que têm juízo. O Presidente é um ator, cercado por uma equipe que escreve seu texto, dirige sua performance, e passa 24 horas por dia adulando-o, convencendo-o de que ele manda, em vez de ser mandado. Vejam o máscara alvar de George Bush, a figura angustiada e turbulenta de Nestor Kirchner, a postura soturna e bem ensaiada de Vladimir Putin, a persona bonachona e televisiva de Jacques Chirac... Vocês acreditam que algum desses canastrões manda em alguma coisa?

Políticos honestos existem, e muitos. Entram no transatlântico achando que de algum modo conseguirão tomar de assalto a ponte de comando, coagir a tripulação à base do chicote e da promessa... “E la nave va”. O navio segue na mesma direção. O Presidente pode ir na direção oposta, mas estará apenas andando pelo convés. Vai chegar a um ponto em que, ou ele pára de andar e segue com o navio, ou então pula na água.

Nenhum comentário:

Postar um comentário