quinta-feira, 14 de maio de 2009

1029) Eu defendo Parreira (4.7.2006)


(ilustração: Nei Lima)

Já sei que muita gente vai botar minha cabeça a prêmio por causa disto, mas eu defendo Carlos Alberto Parreira, que sempre achei (e continuo achando) um dos melhores técnicos do Brasil, mesmo discordando, como discordo, de algumas escalações e opções táticas suas nesta Copa. Talvez não seja o técnico ideal para a Seleção, concordo. Parreira é um homem culto, inteligente, ético, emocionalmente equilibrado, e bastam estas características para desqualificá-lo para uma função onde o sujeito precisa de malandragem, habilidade conspiratória nos bastidores, discurso duplo, ética dupla, mentalidade imediatista, talento para impor a própria vontade dando murro na mesa, em vez de argumentando. Concordo: não é a cara de Parreira.

Felipão teria substituído Cafu, Ronaldo, Roberto Carlos, seus heróis do Penta? Duvido muito. Felipão é o tipo emocional, vê o time como uma “família”, e não iria desprestigiar os primogênitos que lhe deram fama. Parreira convocou a geração da Copa das Confederações (Cicinho, Robinho, Gilberto) mas não teve força política para impô-los. Talvez tenha sido vítima de excesso de cautela (um defeito seu), e pensou: “Pois é, quem me garante que os garotos não vão amarelar?” Optou pelos veteranos, e os veteranos esverdearam.

É fácil escalar onze jogadores. O que não é fácil é escalar onze empresas. Um jogador de Seleção (ainda mais a Brasileira!) é uma empresa bem grandinha. É a ponta de um iceberg formado por equipes de trabalho, assessores, empresários, publicitários, gerentes de Banco, empresas associadas em mil projetos beneficentes, de propaganda, educativos, sociais. Por trás de qualquer um dos nossos 23 craques existe, no Brasil e na Europa, um exército de centenas de sujeitos poderosos e influentes para quem o sucesso pessoal do seu sócio, cliente ou patrocinado é mais importante do que o do time em que ele joga. Se pensarmos que grande parte desses interesses tem sede na Europa, dá para entender melhor essa febre de recordes pessoais enquanto a Seleção Brasileira se arrasta em campo.

Toda a beleza do futebol está dentro das quatro linhas. O que existe em volta delas, principalmente numa Copa, é uma história de arrepiar os cabelos de brasileirinhos zé-ninguém como eu e você, caro leitor. É parecido com a história financeira da construção de Brasília. Com as quedas-de-braço diplomáticas que culminaram no Tratado de Versalhes. Com a partilha do Oriente Médio após a II Guerra Mundial. Briga de cachorro grande. A Copa de hoje é o banquete do Capitalismo Tele-Esportivo: patrocínios, direitos de transmissão, contratos de propaganda, expansão de mercados.. É o regabofe dos executivos, enquanto os ronaldos e ronaldinhos de periferia jogam a grande cartada dos seus parcos 15 anos de vida útil. Parreira? Coitado, o único erro dele foi ter aceitado, sabendo que o Brasil não era mais o franco-atirador de 1994, e sim um Titanic cheio de ouro, cercado por uma frota de navios-piratas.

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