sábado, 11 de abril de 2009

0960) A sociedade da informação (14.4.2006)




Num dos seus poemas mais belos, “Limites”, Jorge Luís Borges nos fala sobre um dos aspectos tristes da velhice (que tem também muitos aspectos alegres): a falta de tempo. Aos 70 anos o indivíduo percebe que seu futuro se estreita cada vez mais. O dia continua com 24 horas, a semana com sete dias, mas agora ele começa a se sentir como o viajante que, depois de dirigir na rodovia durante a noite inteira, começa a enxergar no céu do horizonte o clarão das luzes da cidade para onde se destina. O fim está perto.

Borges medita sobre a ironia de que, antes mesmo de morrer de todo, ele já tenha morrido parcialmente para muitos detalhes da vida. Há um ou outro livro em sua estante que ele já folheou pela última vez; talvez tenha sido há dez anos, mas não importa, foi a última, porque não voltará a tocá-lo. Há uma rua de sua cidade que ele não voltará a cruzar. A velhice é cheia de “últimas vezes”. O corpo morre de uma vez só, mas nossa vida exterior se apaga aos poucos.

Vejo com admiração alguns amigos meus na faixa dos 70 ou 80 anos e penso: quais serão os seus critérios para escolher suas leituras, os filmes que assistem, as atividades a que dedicam seu tempo? Porque sabem sem dúvida que o fim está perto, mesmo que se sintam fortes e sadios. Sabem que não têm mais à sua disposição todos os livros do mundo, como imaginavam ter aos trinta anos. Quantos livros lhes resta para ler, a eles, que já leram milhares?

Vi dias atrás uma frase de Alexander Simon, economista ganhador do Prêmio Nobel. Dizia ele: “O que a Informação consome é muito claro: consome a atenção dos que a desfrutam. Daí, riqueza de informação acarreta pobreza de atenção, e a necessidade de alocar eficientemente esta atenção, por entre a super-abundância de fontes de informação dispostas a consumi-la”. Simon se refere à nossa sociedade abarrotada de livros, jornais, revistas, publicidade, Internet, TV, cinema, rádio, indo até detalhes como o torpedo de celular e os graffiti de muro. Há uma proliferação desordenada de mensagens, e mesmo que 99% delas não nos interessem, o um por cento restante é (pelo menos no meu caso) suficiente para nos manter lendo sem parar durante os próximos dois séculos.

Num certo sentido, esse crescimento exponencial da informação nos deixa um pouco na situação de Borges septuagenário, percebendo que o número de suas horas diminui à medida que o dos livros disponíveis aumenta. Se formos comparar a quantidade de coisas que há para ler (e que gostaríamos de ler, precisaríamos de fato ler), estamos todos com 90 anos de idade. Não vai dar tempo. As estantes estão abarrotadas de livros, cada um deles implorando nossa atenção, mas sabemos que cada hora destinada a um deles está sendo subtraída de todos os outros. É preciso pegar papel e lápis e fazer uma lista de prioridades. Senão não vai dar tempo. O fim da viagem se aproxima, mais depressa do que imaginamos.



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