sexta-feira, 3 de abril de 2009

0946) Os homens elefantes (29.3.2006)



O leitor deve conhecer, pelo menos de ouvir falar, o filme de David Lynch O Homem Elefante (1980), inspirado na vida de John Merrick, um inglês que ganhou este apelido por causa de uma grave doença deformadora. Merrick voltou a ser lembrado na imprensa dias atrás, por causa do estranho resultado de uma experiência de laboratório na Inglaterra.

Um grupo de oito voluntários se inscreveu como cobaias nos testes de uma nova droga produzida pela Parexel, empresa farmacêutica sediada em Boston (EUA). A droga, provisoriamente designada como TGN-1412, é um tipo de anticorpo desenvolvido pela alemã TeGenero, para tratar leucemia e problemas imunológicos, e provocou em alguns voluntários uma reação violenta. Dois foram internados em estado crítico, quatro foram seriamente afetados; dois voluntários que tomaram um placebo (substância neutra, para ver se ocorrem efeitos meramente psicológicos) nada sentiram.

Segundo um destes dois, minutos depois de tomarem a droga os outros seis pacientes entraram em choque. Um deles gritava: “Doutor, minha cabeça dói, minhas costas doem, não posso respirar, socorro!”. Todos vomitavam sem parar. A noiva de um deles declarou: “Ele está muito mal, o sistema imunológico dele simplesmente desapareceu”. E um deles foi chamado de “Homem Elefante”, porque sua cabeça e seu pescoço incharam até ficar três vezes maiores do que o tamanho normal.

A empresa declarou: “Reações tão fortes são extremamente raras neste tipo de teste. Usamos todos os procedimentos padrão que se empregam para testar uma droga em seres humanos pela primeira vez. Há todo um protocolo de precauções, preparado pela empresa e aprovado por comitês de ética e entidades reguladoras”. O fabricante afirmou: “Estes resultados são totalmente inesperados e não refletem os resultados que obtivemos nos testes iniciais de laboratório, os quais nos permitiram experimentar a substância em seres humanos”. Cada voluntário recebeu cerca de duas mil libras, ou 3.500 dólares, para participar do teste.

Há muitos livros e filmes sobre efeitos imprevistos neste tipo de experiência. No Scanners de David Cronenberg, os sujeitos acabam conseguindo explodir a cabeça uns dos outros com um simples esforço mental. Em Jacob’s Ladder de Adrian Lyne, Tim Robbins perde o contato com a realidade e se vê transportado para um mundo de pesadelos e criaturas ameaçadoras. Quando a gente fala sobre “o flagelo das drogas”, geralmente está se referindo às drogas ilegais do prazer (maconha, cocaína, ecstasy, etc.), mas esta é apenas uma face do problema. Existem as drogas legalizadas do prazer (cerveja, uísque, cigarro, etc.); e as drogas terapêuticas legalizadas. Cada uma delas é um abismo de perigos, e uma fonte de alívios. Fomos nós que as inventamos, permitimos que (legais ou ilegais) se tornassem mercados de bilhões de dólares, e, num certo sentido, hoje é sua indústria e comércio que vai na frente, e nós a reboque.

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