sábado, 14 de março de 2009

0884) O Maior Espetáculo da Serra (15.1.2006)



O milênio irá avançando. O mundo irá crescendo, e com ele as dimensões da vida. A população do Brasil será igual à da China de hoje. As cidades irão se expandindo, e na altura do Cajá os derradeiros subúrbios de Campina Grande já estarão se misturando aos primeiros de João Pessoa, as duas metrópoles com milhões de habitantes, estendendo-se uma rumo à outra como duas gotas dágua prestes a transformar-se numa só. Haverá um excesso de gente, um excesso de produtos e de consumo, excesso de demanda e de oferta; e um excesso de tempo a ser preenchido para o lazer das multidões insaciáveis.

Nesse tempo futuro, os acontecimentos míticos se agigantaram. A população presta culto aos grandes embates cuja estatura lendária só fez crescer ao longo das gerações. Campina Grande já é uma megalópole maior que Tóquio ou a Cidade do México, e seus milhões de habitantes mantém viva a chama do Treze x Campinense como o Grande Clássico.

Inchaço populacional, “boom” econômico, mega-indústria do lazer: tudo convergiu para criar a Idéia do Século: o “Clássico 24 Horas”. À meia-noite do reveillon de 2110-2111, perante um estádio lotado onde não cabia mais uma pessoa sequer, ao trilar do apito do árbitro, rolou a bola para o início do Grande Clássico dos Maiorais. Desde então, há várias décadas, Treze e Campinense estão sempre em campo, em tempos sucessivos de 45 minutos, enfrentando-se sem parar, com emocionantes alternâncias no placar. Um jogo 24 horas, que não pára. Jogadores são substituídos, voltam a campo dias ou meses depois. Atletas famosos de passagem pela Paraíba são convidados a dar uma “canja” de 45 minutos. Artilheiros célebres, que estrearam no clássico aos 17 anos, despedem-se dele aos 40. E o jogo não pára.

O jogo não pára. São 24 horas por dia, sete dias por semana. Chova ou faça sol, seja o pingo do meio-dia ou altas horas da madrugada, Treze x Campinense estão sempre em campo, diante de uma platéia flutuante que vai de 20% até a lotação completa do estádio, mas sempre presente, porque na cidade, no Nordeste e no Brasil todos conhecem a lenda do Jogo Que Não Pára. Ônibus de turistas uniformizados de Galo ou Raposa (vindos do Japão, da Índia, da Califórnia) desembarcam diariamente diante dos portões do Estádio. Equipes se revezam transmitindo o jogo por canais de rádio, TV e Internet exclusivos para a transmissão do Clássico dos Maiorais.

Quem vai ganhar? Não se sabe. Em certas épocas, um dos times chega a colocar sobre o outro uma vantagem de dezenas de gols; mas a sorte e a persistência ajudam o perdedor a reduzir essa vantagem até conseguir (num dia de “casa cheia”, ansiosamente esperado ao longo de anos) passar de novo à frente do placar. Gerações de jogadores e de torcedores se sucedem, recordes são batidos, estatísticas se avolumam... O jogo continua, eterno como a vida das espécies, intenso como a vida dos indivíduos: o Maior Espetáculo da Serra.

3 comentários:

  1. Excelente texto! Viva os maiorais!

    ResponderExcluir
  2. É isso aí, Mateus... Se não inventarmos nossos Mitos, ninguém o fará por nós.

    ResponderExcluir
  3. Mó viagem mas excelente texto. E salve o Galo da Borborema.

    ResponderExcluir