quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

0843) A tragédia do Náutico (29.11.2005)



O vício do futebol me coloca às vezes em situações constrangedoras. Sábado passado, interrompi por mais de duas horas um trabalho urgente e importante, e fui assistir (em dois canais simultâneos) os dois jogos que decidiam, em Recife, a Série B do Brasileiro: Santa Cruz x Portuguesa, e Náutico x Grêmio. Estava torcendo pelos dois times pernambucanos, que, se vencessem ambos, subiriam de volta para a Primeira Divisão. Sentiram o drama? Eu sou Sport (lá em casa todo mundo é Sport, por causa de meu pai, que era recifense e torcedor do Leão da Ilha), e fico agora, a esta altura do meu campeonato particular, atrasando meu trabalho pra torcer pelo diabo duma cobra e dum timbu, só porque são nordestinos!

O Santa Cruz fez sua parte, no Arruda: virou de 0x1 para 2x1 ainda no primeiro tempo, e conseguiu a classificação. Vitória justa, se considerarmos que a Portuguesa tem um bom time, mas que finaliza pessimamente. O jogo de acabar com os cardíacos, contudo, foi o do estádio dos Aflitos.

O Náutico perdeu um pênalte ainda no primeiro tempo. No segundo, o juiz expulsou um jogador do Grêmio e logo em seguida marcou um pênalte contra o time gaúcho, o que fez explodir a maior confusão. Um chute na direção do gol que foi providencialmente desviado pelo cotovelo do jogador gremista, que, ainda assim, tem o braço próximo ao corpo e também parece fazer um movimento tentando se esquivar da bola. No mínimo, uma marcação duvidosa. Os jogadores do Grêmio perderam a cabeça, agrediram o juiz, e mais três foram expulsos. Começou aquela cena clássica do futebol brasileiro, com dirigentes gordos e apopléticos invadindo o campo, policiais de armadura dando encontrões em quem estivesse na frente, técnico querendo arrastar o time pro vestiário, vinte e tantos minutos de truculência patética.

Faltavam 10 minutos para terminar: o Náutico tinha 11 jogadores e o Grêmio 7. Bastava converter o pênalte, e talvez até fazer mais um gol, para sacramentar a vitória. Mas aí pisaram na grama as três bruxas de Macbeth. Não se deve brincar com os deuses do futebol, amigos. São deuses célticos e sangrentos, bretões e cruéis. Os deuses do futebol gostam de trovões e relâmpagos. Quando o juiz apitou, o jogador do Náutico bateu pessimamente o pênalte, e o goleiro defendeu. Segundos depois, um jogador do Náutico foi expulso por uma falta desnecessária. A falta foi batida, e Anderson, um desses negrinhos-do-pastoreio que o futebol gaúcho revela de vez em quando, serpenteou de área adentro, arisco, e mandou para as redes. Um a zero, Grêmio campeão.

Em cerca de um minuto o Náutico foi da euforia ao estado de choque, e o Grêmio foi do vilipêndio ao pódio. É por estas e outras que os coleguinhas da página esportiva não cansam de se referir à “magia do futebol”. Futebol é zig-zag, reviravolta, salto quântico, cambalhota do destino, lance de dados que jamais abolirá o Acaso. Ou, como dizem os colegas: é uma caixinha de surpresas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário