segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

0716) Bob Jefferson, o intocável (5.7.2005)



Tenho acompanhado com vivo interesse as últimas agitações políticas nacionais, embora não por interesse pela Política em si. O assunto está geralmente por volta do 37o. lugar em minha Lista de Prioridades. Não porque lhe dê pouca importância, mas porque não tenho muita afinidade. “Legislação Trabalhista”, por exemplo, tema seríssimo, está em 173o. lugar, e “Neurocirurgia”, da qual eu talvez um dia possa precisar, em 268o.

“Roteiro Cinematográfico ou Teatral”, contudo, é um dos meus dez mais, e não posso deixar de pensar no tema quando assisto o noticiário político, porque gosto de ver como no Brasil existe sempre uma linha muito tênue separando a tragédia shakespeariana e a ópera-bufa. Vocês se lembram de Teotônio Vilela, senador alagoano? Nos anos finais da ditadura militar ele descobriu que estava com um câncer incurável, e saiu de Brasil afora, pregando o fim do regime militar. Os militares sabiam que Vilela tinha pouco tempo de vida, e isto o tornou intocável. Não havia necessidade de mandar o homem para o DOI-Codi. O senador transformou-se no “Menestrel das Alagoas”, da canção de Milton Nascimento e Fernando Brant.

É até uma heresia esta comparação, mas algo parecido está ocorrendo com o impagável Roberto Jefferson, embora por motivos diferentes. Ninguém tem coragem de tocar com a ponta do dedo no trêfego deputado, mas não por piedade ou respeito: é medo de morrer eletrocutado. Num ambiente político em que todo mundo parece ter o rabo preso (se não por desonestidade própria, por desonestidade dos amigos e aliados), Jefferson caminha, odiado e intocável. Todo dia ele derruba um. Basta-lhe apontar o dedo para um sujeito e largar uma pista; no dia seguinte correm a Folha, a Globo, a Veja, a Isto É, e descobre-se que aquele cidadão aparentemente inatacável andou, na melhor das hipóteses, em más companhias, autografando documentos suspeitos e traficando a mais perigosa das drogas: dinheiro.

Hoje, a pose de Jefferson me lembra um filme de Chaplin em que, depois de derrotar um valentão, ele sai pela rua com pose de herói; dezenas de pessoas saem às portas, cabeças aparecem nas janelas; ele se vira de repente, e todo mundo some, apavorado. É desse jeito que Bob Jefferson, o pistoleiro, andas hoje pelas ruas da Tombstone em que se transformou Brasília. Todo mundo de revólver na cinta, mas ninguém tem coragem de alvejá-lo, porque ele é rápido no gatilho e firme na pontaria. Só atira onde tem coisa.

Me lembra também a seqüência final de Meu Ódio Será Tua Herança de Sam Peckinpah, quando os quatro pistoleiros, encurralados numa cidadezinha mexicana, sabendo que não têm escapatória, vão para o centro da cidade e promovem uma matança onde não escapa ninguém. Em Brasília está todo mundo armado, todo mundo com bala na agulha – e balas personalizadas, onde estão escritos os nomes dos destinatários. E tudo isso por quê? Por um punhado de dólares!

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