quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

0704) Destampou a caçarola (21.6.2005)


(o deputado Roberto Jefferson)

Meu vôo para o Rio fez escala em Brasília no dia em que o Deputado Roberto Jefferson prestou depoimento na Comissão de Ética da Câmara. Tivemos quase duas horas de atraso. O piloto avisou que havia mais de 15 aviões à nossa frente na lista de decolagem, e um engraçadinho lá atrás comentou: “É o pessoal do PT abandonando o barco”. Depois, outro engraçadinho comentou que de agora em diante a palavra “corruto” tem que se escrever “corrupto”, porque o PT não pode ficar de fora. E quem está divulgando estas graçolas? Eu, que voto no PT há mais de vinte anos (com ocasionais puladas-da-cerca em benefício do PSDB).

A defesa da honestidade e da ética, que o PT sempre ergueu como bandeira, foram uma pedra no sapato de muitos políticos salafrários. Esse discurso ético, se repetido com a devida insistência, acaba incomodando indivíduos que passam a vida toda mergulhados no toma-lá-dá-cá dos favores por baixo do pano, das comissões de 10%, das concorrências fajutas, das sobras do caixa de campanha, das falcatruas que todo mundo sabe e finge que não vê. Eles não ligam a mínima para honestidade. Só ficam irritados porque percebem que aqueles comunistas metidos a besta acham-se superiores a eles. E, como é sabido, o ideal do desonesto é propagar a noção de que todo mundo é desonesto. Quanto mais esta idéia se espalha, mais ele se sente acobertado e autorizado a ir em frente.

O que tem acontecido em certos setores do poder em Brasília me parece aquelas histórias em que numa turma de amigos tem um que não bebe, não fuma, não joga e não freqüenta a Zona. Na primeira chance que têm, os amigos embebedam o cara e o levam para o Cabaré de Zefa, encorajando-o a todas as patifarias. No dia seguinte, mostram-lhe as fotos: “Tá vendo, camarada? Você não é melhor do que ninguém. Você é igual à gente”.

O PT tem nobres intenções e inevitáveis defeitos; o mais recente deles é ter chegado ao Poder. No Poder, o sujeito percebe mais do que nunca que vive entre feras, e sente uma augustiana “necessidade de também ser fera”. O pessoal do PT traz consigo aquela flama incorruptível de uma esquerda que se criou lendo Gorki e Maiakóvski. Um idealismo humanista, baseado na crença (talvez ingênua) de que os seres humanos são fundamentalmente bons.

Acontece que, em política, ninguém é mais honesto do que os aliados que arranja. Fazer alianças é (para usar uma oportuna e reveladora metáfora do presidente Lula) passar um cheque em branco. Tudo que o aliado fizer, estamos assinando embaixo. E no Brasil ninguém governa se não se aliar com a Direita. Não a Direita nazistóide dos integralistas ou da TFP: mas a Direita anti-ideológica que há séculos se dedica à atividade predatória de enriquecer por todos os meios disponíveis. O Brasil é governado há 500 anos por gente que topa tudo por dinheiro, e que sussurra sem parar no ouvido de cada recém-chegado ao Palácio: “Deixa disso. Você é igual à gente”.

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