De vez em quando algum amigo meu se queixa: “Ligo pra sua casa e só dá secretária eletrônica!” Minha resposta: “Claro, foi pra isso mesmo que a instalei”. Ele: “Para manter os amigos à distância?” Eu: “Não, para filtrar as ligações. Eu só atendo o telefone se souber quem está falando”. Uma das razões para isto é a praga do telemarketing que, pelo menos aqui no Rio, é uma dor de cabeça permanente para quem tem telefone em casa. Você entra no chuveiro, o telefone toca, e você, que está esperando uma ligação importante, enrola-se na toalha e sai molhando o corredor até o aparelho. Do outro lado, uma voz feminina cheia de jovialidade lhe pede uma doação para um asilo de velhinhos. Nada contra os velhinhos, mas minha única vingança possível é dizer que não, muito obrigado.
Ou então eu interrompo uma refeição para atender, e do outro lado é uma moça que tenta por fina força me convencer a aceitar mais um cartão de crédito além dos dois que já possuo. Ou então é um banco atrás de novos correntistas. Ou então uma corretora de seguros. Ou então uma editora me oferecendo assinatura de revista a preço de banana. Por estas e outras eu não interrompo mais o meu banho, não deixo um prato pela metade, não largo o teclado quando ouço o telefone tocar lá fora. Se o fizesse, não teria tempo para mais nada senão ficar repetindo “Não, muito obrigado”, com a resignação de um papagaio.
Às vezes, quando a interrupção vem num momento mais inadequado, a vontade que me dá é explodir, dizer palavrões, tratar mal a pessoa lá do outro lado. Duas lembranças me dissuadem disto. A primeira é o fato de que nos EUA, há pouco tempo, uma dona-de-casa atendeu mal uma dessas ligações e o telefonista (era um cara de maus bofes) passou a ameaçá-la – afinal, ele sabia o nome, o telefone e o endereço dela, e ela não sabia nada sobre ele. A segunda é o fato de que minha filha já foi telefonista do Sebrae e mais de uma vez chegou em casa com os olhos inchados, porque algum brutamontes de maus bofes a tratou mal. Eu sou do tempo antigo, e o que não quero que façam à minha filha não vou fazer à filha dos outros.
Aliás, quero refazer esta última colocação. Todos nós que temos de quarenta anos pra cima vivemos reclamando da estupidez de certos hábitos contemporâneos, e contrapomos a eles os hábitos “do tempo antigo”. Amigos, mudemos de estratégia. Dizendo assim estamos desvalorizando nossos valores. Tratar bem a filha dos outros não é coisa antiga, é coisa moderna, é civilização. Invadir o espaço telefônico alheio, não é eficiente nem moderno: é uma grosseria, um desprezo pelo cliente, comparável ao “spam”. Minha resposta atual, quando tenho o azar de atender uma ligação assim, é dizer: “Eu estava interessado, sim, em adquirir um novo cartão, mas recuso-me a me envolver com uma empresa que interrompe minhas atividades dessa forma grosseira e não-solicitada. Vocês acabaram de perder um cliente. Passe bem!”
Hmmmm... somos do tempo do Teobaldo, o Boko Moko. Bons eram aqueles tempos, sem telemarketing ativo, passivo, de guerrilha, etc.
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