Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
sábado, 29 de março de 2008
0326) Profissionalismo (6.4.2004)
(A escola no ano 2000 - gravura francesa)
Antigamente as pessoas aprendiam a fazer fazendo. Entrava-se numa profissão porque o pai e o avô já faziam aquilo, de modo que o futuro fazedor daquilo crescia num ambiente saturado de informação, motivação, vivência. Outras vezes, descobria-se precocemente num garoto um certo talento para alguma coisa (tocador de alaúde, ferreiro, domador de cavalos), e o garoto promissor era encaminhado a um Mestre no ofício, que tornava-se uma espécie de segundo pai e ensinador de tudo. Ou então o sujeito era forçado a trabalhar para manter a família, e não escolhia vocação: pegava o que aparecia, e aprendia o ofício na dura lei do dia-a-dia, da tentativa-e-erro.
Isso, no entanto, era em 1900-e-cocada. Hoje em dia, inventou-se uma palavra mágica: o Curso. Tem curso para tudo no mundo, a maioria deles nas universidades particulares, que brotam no solo brasileiro mais rapidamente do que as favelas. Não nego que a idéia por trás dos cursos universitários seja uma boa idéia. De boas idéias está cheio o mundo e a escalação da Seleção. Resta ver o que acontece na prática. Em teoria, o candidato a aprendiz iria passar 4 ou 5 anos de sua vida estudando, de forma concentrada e intensiva, tudo que dissesse respeito à sua futura profissão. Uma lavagem cerebral do-Bem. Quando saísse dali, estaria pronto para arregaçar as mangas e atender a clientela. Mas deve ter um bug qualquer no meio do processo, porque o Brasil está cheio de administradores que não sabem administrar, advogados que não advogam, filósofos que jamais filosofarão. Pode ser um problema de mercado de trabalho; mas pode ser o fato de que em algum trecho do processo a intenção se perdeu, e o cara não passa de um leigo com diploma.
Hoje em dia, todo futuro artista diz aos jornais: “Eu pretendo seguir a carreira artística, e já me inscrevi em cursos de Dicção, Empostação da Voz, Interpretação, Canto, Dança e Mímica.” Tem curso para tudo. E o jovem artista acredita, com toda a sinceridade dos verdes anos, que basta fazer um curso para ficar sabendo tudo que os outros sabem. Que me perdoem os jovens, mas eu acho que estão latindo na árvore errada. Eles acham que passar alguns meses ou anos cochilando na última fila de um cursinho é uma maneira prática de adquirir conhecimentos.
Eu ainda acho que futebol se aprende no campo, jornalismo na redação, música no palco e natação na água. Não sou contra os cursos e as escolas: sou contra a idéia simplória de que quem fêz um curso sabe mais da profissão do que quem não o fêz. Tem meia dúzia de profissões (Medicina, Odontologia, Engenharia, etc.) onde vai ser muito difícil o sujeito ser um autodidata competente, mas estas são as exceções, não a regra. Criou-se no mundo uma idéia de profissionalismo que não passa de um corporativismo disfarçado. O verdadeiro profissionalismo é o que valoriza o exercício competente da profissão, no universo da própria profissão, independentemente de como a profissão foi aprendida.
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