sexta-feira, 28 de março de 2008

0312) O Zé Pelintra de Chumbo (20.3.2004)




Hoje, na casa de amigos, fiquei assistindo trechos de um DVD do Led Zeppelin, com apresentações ao vivo gravadas nos anos 70, no auge do sucesso da banda. E fiquei meditando um pouco sobre toda essa história de “heavy metal”, um tipo de rock do qual nunca fui grande admirador, mas que até hoje espanta e fascina milhões de pessoas. 

O heavy metal é acima de tudo um vagalhão sonoro, como aquelas ondas gigantescas do Havaí: algo que se abate sobre nós, submergindo-nos por completo. Antes de ser música no sentido tradicional de melodia e harmonia, é uma experiência sensorial, algo que devemos absorver com o corpo inteiro, e não apenas com os tímpanos.

Alguém poderá objetar que todo show de rock é assim. Mas nos primórdios do rock contemporâneo não era. Vejam as fotos dos Beatles no Shea Stadium, em Forest Hills, em todos os lugares onde se apresentavam entre 1964-65 para públicos de 15 a 20 mil pessoas. A amplificação era qualquer coisa, qualquer nota. Não existiam ainda as mesas e as poderosas caixas-de-som que nos anos 70 fariam a fama das bandas metaleiras. 

Comparado ao que o Zeppelin, The Who e outras bandas estariam fazendo cinco anos depois, o som dos Beatles era uma vitrola de piquenique.

O Led Zeppelin produzia um tremor-de-terra semelhante à decolagem de um ônibus espacial, mas isso era um bônus que se somava à enorme musicalidade do grupo. Basta revê-los tocando “Going to California” ou a inevitável “Stairway to Heaven” para perceber que o conceito de amplificação de som, numa banda como aquela, não era voltado apenas para o super-espetáculo auditivo, mas também para a criação do que poderíamos chamar de gigantescos close-ups sonoros, onde uma aparelhagem poderosa e sofisticada tornava audível cada respiro e sussurro do vocalista, cada trastejo ou harmônico de um violão acústico.

Em Revolution in the Head, a meu ver o melhor livro já escrito sobre a música dos Beatles, o recentemente falecido Ian MacDonald observava que o heavy metal se originou de uma transição, em meados dos anos 1960, das bandas de quatro integrantes com volume acústico mediano (caso dos Beatles) para o “poderosos trios” que empregavam enorme amplificação. 

Nessa mudança, a guitarra-ritmo (ou guitarra-base) era eliminada, e seu espaço era preenchido pelo recurso de aumentar o volume do baixo, microfonar mais de perto a bateria, e encher de distorções a guitarra solo. Com isso, o rock ganhou em poder auditivo: MacDonald chama a música resultante de “um esporte-de-contato sonoro”, enquanto Jon Pareles define a música do Zeppelin como “esculturas em ruído”. 

A perda foi pelo lado das composições. Os guitarristas-ritmo eram geralmente compositores, e provinha deles um senso mais nítido de estrutura e de harmonia nas canções. O Zeppelin é o ponto alto do heavy metal, antes que o gigantismo sonoro engolisse o artesanato das melodias, harmonias e letras.






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