(Catedral em Chamas, foto de Gustavo Moura)
Não se iludam: a Biblioteca de Alexandria não ardeu em chamas uma vez só. Neste exato momento em que escrevo e que você me lê, existe uma biblioteca inteira virando fumaça em algum lugar do mundo. Sossegue: o que está se perdendo não são grandes obras da literatura. São os arquivos pessoais de um débil-mental qualquer que não sabe administrar direito seus recursos informáticos, e vez por outra manda para o espaço todos os arquivos do seu disco rígido, todos os seus programas, às vezes o trabalho de um mês, às vezes o de uma vida inteira.
Conheço um cara (não vou dizer quem é) que, nos velhos tempos do DOS, viu surgir na tela uma pergunta tipo: “Format C? Y N ”, hesitou só um instante e teclou Y, “yes”, achando, certamente, que o C, que ele sabia ser o disco rígido com todos os seus arquivos, estava meio desorganizado, meio desformatado, e não custava nada dar-lhe uma boa formatação, que pelo jeito significava colocar os arquivos por ordem cronológica, ou alfabética. Minutos depois ele ficou sabendo que formatar um disco é algo parecido com apagar um quadro-negro.
Na virada do Ano Novo dei uma guaribada no meu computador, que incluiu um HD de 80 Gigabytes para substituir o anterior, de 10 Gb, o qual estava tão cheio que toda vez que eu esbarrava na mesa derramava arquivos sobre a escrivaninha. Veio aqui em casa o técnico que habitualmente faz esses upgrades. Enquanto ele instalava o disco e os outros penduricalhos, eu folheava uma revista e respondia suas perguntas.
Nisto, o telefone toca, é um assunto urgente que me prende durante meia-hora. Enquanto isto, o cara reinstala o Windows, reinstala o Internet Explorer, reinstala o Outlook Express. Quando volto, encontro apenas as cinzas fumegantes de Alexandria. Esqueci de avisar a ele que queria manter os cerca de 500 Bookmarks (ou Favoritos) do Explorer, pacientemente capturados em madrugadas insones. Esqueci de avisar que queria manter o caderno de endereços do Outlook anterior, ou seja, todos os meus correspondentes eletrônicos. E esqueci de avisar que precisava daquelas 2.300 mensagens recebidas e 1.800 mensagens enviadas que atulhavam o Outlook. Como o profeta Jeremias, ajoelho-me e choro, enquanto, como dizia Castro Alves, “silêncio sepulcral estende as asas sobre a vasta ruína fumegante.”
Perdi tudo! Não, ora que diabo, não perdi nada. Endereços a gente volta a recolher (escrevam, amigos!). As mensagens não-salvas foram para o espaço, com discussões, filosofias, conversas pessoais, muitos versos, muitos trocadilhos infames, muita falação-da-vida-alheia, muito nhém-nhém-nhém por causa de dinheiro, e muitas frases inesquecíveis. Tão inesquecíveis que destruídas inda perduram, junto com as frases ditas ao ar livre, à brisa do mar, e que nenhuma fita magnética registrou. Ficam em nossa lembrança, que é a memória-RAM do tempo. A gente só esquece quando não tem mais com que lembrar.
Conheço um cara (não vou dizer quem é) que, nos velhos tempos do DOS, viu surgir na tela uma pergunta tipo: “Format C? Y N ”, hesitou só um instante e teclou Y, “yes”, achando, certamente, que o C, que ele sabia ser o disco rígido com todos os seus arquivos, estava meio desorganizado, meio desformatado, e não custava nada dar-lhe uma boa formatação, que pelo jeito significava colocar os arquivos por ordem cronológica, ou alfabética. Minutos depois ele ficou sabendo que formatar um disco é algo parecido com apagar um quadro-negro.
Na virada do Ano Novo dei uma guaribada no meu computador, que incluiu um HD de 80 Gigabytes para substituir o anterior, de 10 Gb, o qual estava tão cheio que toda vez que eu esbarrava na mesa derramava arquivos sobre a escrivaninha. Veio aqui em casa o técnico que habitualmente faz esses upgrades. Enquanto ele instalava o disco e os outros penduricalhos, eu folheava uma revista e respondia suas perguntas.
Nisto, o telefone toca, é um assunto urgente que me prende durante meia-hora. Enquanto isto, o cara reinstala o Windows, reinstala o Internet Explorer, reinstala o Outlook Express. Quando volto, encontro apenas as cinzas fumegantes de Alexandria. Esqueci de avisar a ele que queria manter os cerca de 500 Bookmarks (ou Favoritos) do Explorer, pacientemente capturados em madrugadas insones. Esqueci de avisar que queria manter o caderno de endereços do Outlook anterior, ou seja, todos os meus correspondentes eletrônicos. E esqueci de avisar que precisava daquelas 2.300 mensagens recebidas e 1.800 mensagens enviadas que atulhavam o Outlook. Como o profeta Jeremias, ajoelho-me e choro, enquanto, como dizia Castro Alves, “silêncio sepulcral estende as asas sobre a vasta ruína fumegante.”
Perdi tudo! Não, ora que diabo, não perdi nada. Endereços a gente volta a recolher (escrevam, amigos!). As mensagens não-salvas foram para o espaço, com discussões, filosofias, conversas pessoais, muitos versos, muitos trocadilhos infames, muita falação-da-vida-alheia, muito nhém-nhém-nhém por causa de dinheiro, e muitas frases inesquecíveis. Tão inesquecíveis que destruídas inda perduram, junto com as frases ditas ao ar livre, à brisa do mar, e que nenhuma fita magnética registrou. Ficam em nossa lembrança, que é a memória-RAM do tempo. A gente só esquece quando não tem mais com que lembrar.
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