Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
segunda-feira, 10 de março de 2008
0170) A morte térmica do universo (7.10.2003)
O poeta Eliot dizia que o fim do mundo não vai acontecer com uma explosão, mas com um lamento. Já os cientistas nos garantem que se o nosso Universo emitir algum som no instante de se acabar, esse som será “brrrr...” Ou seja: o Universo vai morrer tiritando de frio. O conceito da morte térmica (“heat death”) se popularizou na ciência contemporânea, na poesia, na literatura de ficção científica. A morte térmica ocorre quando as derradeiras fogueiras termonucleares (que chamamos de “estrelas”) tiverem consumido seu combustível, e forem se apagando de uma em uma. Nenhuma delas escapa à lei que as empurra na direção da morte térmica, e que é a Entropia.
Se não conhecia essa palavra, caro leitor, anote. É a palavra mais atemorizante do dicionário da ciência. A Entropia é um conjunto de conceitos que explicam o fato de nosso Universo estar caminhando na direção de um estado de esfriamento, imobilização, perda de energia, morte. A imagem básica para entender a entropia é a da xícara de café e do sorvete deixados em cima de uma mesa. Horas depois, tanto o café quanto o líquido do sorvete estarão à mesma temperatura, ou seja, à temperatura ambiente. O café perdeu o calor, e o sorvete perdeu o frio. Por que? Tanto esse calor quanto esse frio tinham sido colocados ali por força de um dispêndio de energia (o fogo do fogão, o resfriamento da geladeira), mas, como diz a sabedoria popular, “de onde se tira e não se bota, um dia acaba”. O ambiente dissipou o calor do café e o frio do sorvete, e para restituí-los ao seu estado anterior seria preciso fazer nova aplicação de energia.
A Entropia tem servido na literatura como metáfora para civilizações em decadência, casamentos consumidos pela rotina, indivíduos que se recusam a se relacionar com o mundo e vão mergulhando na loucura, no silêncio, na solidão. Qualquer sistema que se fecha em si próprio, sem captar energia externa, acaba consumindo sua própria energia e alcançando sua “morte térmica” individual. Claro que, literariamente, o conceito não é tão rigoroso quanto o da ciência. É uma metáfora, cujas variações estão presentes em toda a arte contemporânea. São os casais esgotados e gélidos dos filmes de Antonioni ou de Bergman; são as catástrofes ambientais que os personagens aceitam passivamente nor romances de J. G. Ballard; são as metrópoles futuristas e decadentes dos romances de Jack Vance ou Philip K. Dick.
Exemplo recente dessa vasta metáfora está na frieza que permeia o mundo de “Inteligência Artificial” de Spielberg: humanos insensíveis, máquinas que envelhecem e decaem, cidades cobertas de água gelada. Em muitos casos da FC o contato com alienígenas é visto como a chance de re-energizar uma humanidade exausta, apática, dependente da tecnologia. Em “2001” de Kubrick, em “Stalker” e em “Solaris” de Tarkovsky, o Alienígena surge como uma fonte de mistério, de inquietação. Ele traz uma fagulha de energia nova que nos traz de volta à vida.
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