sexta-feira, 23 de novembro de 2012

3038) O Diário de Dilma (23.11.2012)



(ilustração: Caco Galhardo)


A revista Piauí tem uma página intitulada “O Diário de Dilma”, um pseudo-diário atribuído à presidenta Dilma Roussef. A gente tem o direito de achar que está numa democracia quando alguém ridiculariza o mandachuva do país e não é preso. O “Diário de Dilma” não ridiculariza a presidenta, até pelo irrealismo da proposta, mas faz uma engraçada justaposição entre o pessoa real e a personagem literária, uma perua sempre preocupada com o penteado, o vestido, a decoração; que reduz às mais terrificantes banalidades alguns episódios sérios do momento; que suspira de langor por um embaixador bonitão, ou por um ministro cujo charme a conduz a devaneios. A revista atribui o “Diário” ao jornalista Renato Terra, mas, como também o atribui, em primeiro lugar, à própria presidenta, uma coisa relativiza a outra, e talvez o texto não seja produto de nenhum dos dois.  Talvez o seu redator seja alguém insuspeito e improvável.

O “Diário” de outubro (na Piauí de novembro) vem sob o título “Malandro é o curupira, que só faz gol de calcanhar”.  É a reta final da campanha eleitoral, e “Dilma” comenta: “Tô cheia de usar vermelho por causa desses comícios! Encomendei uns blazers bacanas de verão, laranja, azul Klein, rosa-choque, mas o Lula insiste em me botar de vermelho.  Pareço um tomate”. No dia 4, após o primeiro debate entre Barack Obama e Mitt Romney, ela anota: “A Ideli não confessa, mas é louca pelo Romney. Cada vez que a tevê dá um close naquele queixo talhado a buril, ela dá uma tremelicada. É sutil mas eu percebo”.

Parece os diários das adolescentes que leem Thalita Rebouças. Em 5 de outubro ela se queixa: “Sabe onde me enfiaram agora? Na exposição de um tal de Caravaggio. Legal até, mas o povão está interessado nisso? Tive de fazer biquinho e cara de raciocínio, o que é péssimo para as comissuras. Vou mandar a conta do refil do botox para a União e não quero nem saber”.  No dia 17, ela fica matutando: “Tadinho do Zé Dirceu. Será que tem consulado do Equador aqui em São Paulo?”. Fica ansiosa para saber quem matou Max na novela Avenida Brasil, manda a Abin investigar, recebe a resposta e, na véspera de um comício na Bahia, diz que “dependendo do clima, incendeio a militância revelando o nome ali mesmo”.

O “Diário de Dilma” funciona um pouco como aquelas canções de Juca Chaves satirizando o governo Juscelino (eita, fui longe agora – talvez só eu e Dilma lembremos essa época!). É uma leitura galhofeira de fatos reais, e a verdade é que nada reafirma tanto a solidez de um regime quanto a magnanimidade com que tolera (quem sabe até financia) a atividade dos que o submetem à caricatura.


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