sábado, 19 de setembro de 2009

1268) “Fernando e Isaura” (6.4.2007)



O primeiro romance de Ariano Suassuna, de 1956, só foi publicado 38 anos depois. O autor o considerou um “exercício de juventude”, um afiar de lâminas para a batalha mais séria que viria a seguir, o Romance d’A Pedra do Reino, elaborado entre 1958 e 1970. Comparado a este, Fernando e Isaura é um trabalho menor, uma noveleta sem a profundidade ou a amplitude do outro livro, o qual, escrito depois, foi publicado primeiro, e tornou-se o termo de comparação para tudo que o autor viesse a publicar em seguida.

Fernando e Isaura é um conto de amor impossível, amor fadado à tragédia desde o começo. A ação se passa entre Alagoas e Pernambuco. Fernando é um rapaz órfão, criado pelo tio, Marcos, um fazendeiro viúvo. Um dia, numa viagem, ele se mete numa briga, é ferido e passa dois dias com febre, delirando. Quem ajuda a cuidar dele é uma moça dessa cidade, Isaura. Algum tempo depois, é justamente esta Isaura que Marcos pede em casamento, e como não pode ir pessoalmente, encarrega o sobrinho, que ele ama como um filho, de fazer o casamento em seu lugar, por procuração. Dias antes da data do casamento, Marcos encontra por acaso Isaura, numa cidade próxima. Ele não sabe que ela é a noiva do tio, e apaixona-se por ela. Ela não sabe quem é ele, apenas reconhece o rapaz de quem tratara, e por quem se apaixonara desde então. Os dois são fulminados por uma fatídica paixão à primeira vista. Só depois que passam uma noite juntos descobrem suas verdadeiras identidades, e se desesperam.

Seguem-se outras peripécias, que não revelarei para não estragar a leitura (o livro foi publicado pelas Edições Bagaço, de Recife). Como as histórias baseadas nas lendas medievais, o Acaso e o Destino têm um papel importante na ação. As coincidências e os equívocos de identidade acontecem de maneira tão inesperada que aquilo, pensa o leitor, não pode deixar de ser manobrado por alguma Força Cósmica. Estamos aqui diante de um dos principais mecanismos do melodrama, um mecanismo tão poderoso que é usado, nem sempre de maneira sábia, há trezentos anos.

Na “Advertência” escrita para publicação, em 1994, o Autor confessa-se meio constrangido por oferecer ao público de hoje, principalmente aos jovens, uma história “tão fora de moda”. Ele não diz isto por achar que os sentimentos expressos no livro estão superados, mas por considerar que “os conflitos que, por causa da paixão, atormentam, aqui, os personagens, provavelmente não serão nem sequer entendidos pela geração formada por educadores que procuram fechar os olhos até para a realidade monstruosa do crime, contanto que não sejam forçados a admitir a verdade de qualquer norma moral.” E acha também que uma história tão apaixonada será esnobada “neste tempo de autores frios, lúcidos e impiedosos”. O autor é pessimista demais; “Fernando e Isaura” tem o carisma das grandes tragédias, e, com meia dúzia de bons atores, daria um excelente média-metragem.

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