sábado, 24 de janeiro de 2009

0774) Cheiro de 82 (10.9.2005)


Domingo passado a Seleção Brasileira deu um show de bola de 28 minutos, quando marcou quatro gols no Chile e liquidou o jogo que a classificou para a Copa da Alemanha. Durante esse tempo, a Seleção fez o que todo torcedor sonha: apossou-se da bola com autoridade, imprensou o adversário em seu próprio campo, exibiu classe, técnica, velocidade, consciência tática. Defendeu-se com firmeza e atacou com entusiasmo, não esquecendo a malícia e a ginga. Bastou isto para na segunda-feira a crônica esportiva entrar no delírio ufanista de sempre, falando em favoritismo e “rumo à consagração”. O brasileiro tem essa mania de superar um obstáculo e achar que “agora é só correr pro abraço”. Calma com o andor, pessoal. Vejam só o que aconteceu com o PT.

Sinto um cheiro de 1982, quando a Seleção de Telê Santana – a minha favorita em todos os tempos – saiu rumo à Copa da Espanha já com o carnaval da vitória sendo preparado a todo vapor. Lembro que após a última goleada antes da viagem, a “Veja” publicou uma extensa matéria em que inclusive, com recurso a gráficos e desenhos, explicava inebriada as principais jogadas de ataque do time que tinha também o seu quadrado mágico (Cerezo, Falcão, Zico e Sócrates). A derrota desse time foi um tsunami moral do qual levamos anos para nos recuperar.

Quando o Brasil começou a disputar as Eliminatórias, escrevi um artigo (“A Copa do Mundo é nossa”, 7.9.2003) em que afirmava: “Hoje o Brasil começa uma caminhada rumo ao altar dos sacrifícios. Nenhuma força política, econômica ou futebolística da Europa permitirá que em 2006 cheguemos aos seis títulos, deixando Itália e Alemanha nos três atuais.” Com ou sem quadrado mágico, com ou sem favoritismo, pedaladas, com ou sem o Melhor do Mundo ou o Imperador, preparem-se, porque vamos cortar um dobrado. Temos cinco Copas; Alemanha e Itália têm três cada uma. Se permitirem que cheguemos aos seis títulos, nunca mais nos alcançarão. A Copa do ano que vem vai ser, principalmente para a Alemanha, como aquele “game” decisivo no tênis, quando um jogador em desvantagem tem a chance de quebrar o serviço do adversário e no “game” seguinte sacar para igualar a contagem. Caso não o consiga, será deixado para trás de forma quase irreversível, e só um desastre poderá salvá-lo.

Desta vez é a Alemanha quem está sacando (para manter a metáfora tenística), por jogar em seu próprio terreno; jamais pode se dar o luxo de não ganhar este torneio. O Brasil tem sem dúvida uma equipe magnífica: ganhou com brilho a Copa América e a Copa das Confederações. Mas está, perigosamente, atingindo seu ponto máximo um ano antes da verdadeira disputa – justamente o que aconteceu com a Argentina na última Copa, que era um time assombroso em 2001 e pagou um mico histórico um ano depois. Agora – se por acaso a gente ganhar no ano que vem, a gente bota vantagem, e pode até mandar o Flamengo representar o país na Copa de 2010.

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