(time do Treze, com Garrincha)
Mário Vinicius Carneiro é hoje o historiador do Treze
Futebol Clube, posto que herdou informalmente do inesquecível Severino Marinho
Leite. Seu livro Treze Futebol Clube: 80
Anos de História (A União, 2006) é uma obra imensa e preciosa, tornada
minúscula apenas diante da gigantesca tarefa a que se propôs: contar a história
do clube mais querido e mais heróico da Paraíba.
Ele me pede, para outro trabalho, um breve relato de “dez
jogos inesquecíveis” do Galo. Eu poderia enumerar aqui dez vitórias
arrasadoras, entre milhares. Mas prefiro destacar jogos que, independente do
seu resultado, tenham sido marcantes na minha história pessoal como torcedor.
1)
Durante muitos anos eu, garoto ainda, lamentei não ter
podido assistir a partida de 6 de janeiro de 1961 quando o Treze empatou em 1x1
com o Dínamo, de Bucarest. Consta que foi o primeiro jogo internacional
realizado em Campina Grande. Não foi o primeiro jogo internacional do Treze: em
16 de dezembro de 1951 o Galo havia perdido de 3x2 para o Vélez Sarsfield
(Argentina), num amistoso em João Pessoa. O Dínamo ficou sendo uma espécie de
lenda em Campina; o pessoal dizia que no primeiro tempo o sol forte castigou os
romenos, mas quando o sol foi esfriando eles botaram pra correr e deram uma
prensa no time do Galo.
2)
Outro jogo histórico foi quando o Treze enfrentou a
Seleção da Romênia no Estádio Presidente Vargas, em 8 de fevereiro de 1968. O
time romeno era mais ou menos o mesmo que dois anos depois seria derrotado pelo
Brasil na Copa do Mundo do México. O grande detalhe esse jogo foi a presença de
Garrincha jogando pelo Galo. Nessa época, o grande Mané vivia viajando pelo
Brasil, jogando partidas por clubes de qualquer lugar, por uns trocados. Gordo
e sem muita força para driblar, mas (segundo os que tomaram umas e outras com
ele) simpático e bem humorado. Só fez uma jogada certa: pegou a bola quase na lateral
do campo e fez um cruzamento longo na cabeça de outro atacante, e o Estádio
inteiro ficou de pé ao mesmo tempo.
3)
Não posso deixar de fora o dia histórico em que o Galo se
tornou campeão paraibano invicto de 1966, derrotando o Campinense por 1x0, gol
de Cocó. O presidente do Galo era Edvaldo do Ó, também reitor da Universidade
Regional , que costumava bater de frente com quem se atravessasse. O Treze
nesse ano rompeu com a imprensa e editou seu próprio jornal (“A Tarde”); as
rádios eram proibidas de transmitir os jogos no Estádio Presidente Vargas. Um
ano antes, quando o campeonato de 1965 ainda estava em curso, ele havia
anunciado pelo rádio: “Este campeonato já está perdido, mas eu prometo à
torcida que no ano que vem o Treze vai ser campeão invicto”.
4)
Tem jogos que nem são tão importantes assim, mas a gente
não esquece. Por volta de 1976 Treze e Campinense estavam numa fase de grandes
contratações. O Galo tinha contratado desde o ano anterior o meia Soares e o
atacante João Paulo. Foi marcado um amistoso no Amigão, uma espécie de caça-níquel
de pré-temporada, e o Treze derrotou o Campinense por 2x0, gols de Soares e
João Paulo. A imprensa rubronegra estrilou, queixando-se de que os reforços do
time Raposa não tinham chegado a tempo para o jogo. E foi marcada uma partida revanche
para a semana seguinte, no mesmo local. E dessa vez o Campinense entrou
completo, com todas as novas estrelas reluzindo. E o Treze ganhou de 2x0, gols
de Soares e João Paulo. Foi o famoso “jogo replay”.
5)
Em 8 de dezembro de 1974, um jogo histórico do Galo no
antigo Estádio Leonardo da Silveira, na capital. O Treze precisava de uma
vitória sobre o Botafogo para conquistar o quarto e último turno de um
campeonato onde o Campinense já ganhara os três primeiros. A BR-230 ficou
congestionada nesse dia de tantos ônibus e carros partindo para João Pessoa. A
torcida alvinegra invadiu o Estádio e vibrou do começo ao fim com a vitória por
2x1, gols de Fernando Canguru de cabeça e Vandinho. Foi um jogo literalmente
“ganho pela torcida”.
6)
Nessa mesma época, o Treze inaugurou os refletores do
Estádio Amigão num amistoso com o Flamengo carioca, em 13 de agosto de 1975. Isso
foi no auge do meu envolvimento como torcedor. Lembro que passei a noite da
véspera nos fundos do Cine Babilônia (cujo gerente, Luiz Teixeira, era trezeano
autêntico), dando instruções ao pintor de cartazes (cujo nome não lembro agora)
para pintar as faixas que íamos levar no dia seguinte, das quais só lembro os
dizeres de uma: “O Treze saúda a imprensa, / testemunha da sua História”. Com a
bola rolando, o Treze abriu o placar logo no início com João Paulo, e o
Flamengo virou com dois gols de Zico, vencendo por 2x1.
7)
Seria meio ufanista registrar como inesquecíveis apenas
as vitórias. As derrotas também são. Vou escolher como exemplo a da decisão do
Campeonato Paraibano em 8 de fevereiro de 1965, um jogo noturno no “Plínio
Lemos” (o estádio do Campinense). O Campinense ganhou por 2x1, de virada, com
um jogador a menos (Zé Preto foi expulso no 1º. tempo), com um gol de cabeça de
Zé Luiz. Três anos depois eu estava trabalhando na Reitoria da FURNe com Zé
Luiz, e disse a ele que jamais o perdoaria por aquele gol, ao que ele deu uma
grande gargalhada (pois agora já estava jogando no Treze.) Naquela “noche
triste”, ensopei três travesseiros de choro.
8.
Não foi propriamente um jogo, mas ficou na história. Em
1974 o Treze estava há não sei quantos jogos sem ganhar do Campinense, um
“tabu” que já durava mais de um ano. Muita coisa, considerando-se que em um ano
os “maiorais” jogam várias vezes entre si. E então veio o “Torneio Início” do
Campeonato Paraibano, um costume que não existe mais, onde os todos os times do
campeonato disputam partidas de 15 ou 20 minutos em 2 tempos, decididas nos
pênaltis em caso de empate. Nesse ano o Treze venceu o Guarabira, o Botafogo-PB
e na decisão o Campinense, todos pelo placar de 2x0. Foi esse jogo que revelou
o artilheiro Fernando Canguru, que marcou os 2 gols da decisão e virou grande
ídolo do Galo.
9.
Tentei me lembrar de alguma grande goleada, porque
goleada é sempre uma festa. E me veio à memória um período de uns dois meses,
entre julho e agosto de 1973, em que o Treze aplicou uma série de goleadas em
times paraibanos: 8x1 no Santos (de João Pessoa), 8x0 no Esporte (de Patos),
8x1 no Guarabira e 10x0 no Santa Cruz (de Santa Rita). Nessa época, eu assistia
todos os jogos na arquibancada atrás do gol do portão de entrada, e era uma
festa. Quando o Treze pegava a bola e partia em nossa direção, começava um coro
frenético: “Lá vem, goleiro! Lá vem!” E
era um bombardeio, porque tínhamos um ataque muito bom, com Assis Paraíba,
Vandinho, Zé Pequeno, Haroldo e outros. Quando a “carga da brigada ligeira”
partia e a arquibancada ficava toda de pé, era uma beleza, nunca me diverti
tanto.
10.
E para não ficarmos apenas nos jogos da antiga, registro
um que curiosamente vi na tela do computador, poucas semanas atrás: Caxias 1x3
Treze, em Caxias do Sul, quando o Treze conseguiu a ascensão para a série C do
Brasileirão. Uma partida impecável do Galo, que sofreu o gol de abertura,
empatou ainda no primeiro tempo, virou no começo do segundo e fechou-a-tampa no
finzinho com um gol sensacional de contra-ataque.
Cada jogo do Galo é uma página da História! Amar um time de futebol é ser casado com o
Imprevisível e virar sócio do Acaso. Eu vivo dizendo que larguei o vício, e de
repente olha eu aqui.
(Esta crônica foi publicada no meu livro "A Fonte dos Relâmpagos", Editora Arribaçã, Cajazeiras, 2022)