Gravar um CD com as benditas músicas que as pessoas
gostam.
Elucidar o Mistério das Máscaras de Chumbo.
Concluir o projeto alquímico-cibernético da abertura de
um portal para um mundo menos chato.
Inventar um idioma aglutinante desprovido de vogais.
Consertar o encanamento da área de serviço.
Resolver o problema daquela esquina em Manaíra onde chega
a ter três batidas de carro por dia.
Ler os 163 livros em PDF gratuito armazenados no
computador.
Chamar para beber no bar cinco amigos meus que têm tudo a
ver uns com os outros e que não se conhecem pessoalmente.
Fazer cirurgia naquele calo-de-sangue na sola do pé.
Trocar a porta do armário onde deu cupim.
Juntar num volumezinho os poemas alheios que já traduzi.
Descobrir como passar as fotos do celular velho para o
celular novo.
Redigir e fazer publicar na grande imprensa uma “Carta
Aberta aos Políticos Brasileiros”.
Recomeçar a jogar Riven (eita como eu sou velho).
Editar uma versão de “Grande Sertão: Veredas” com 800
páginas de notas.
Deixar a barba crescer e fazer um certo mistério a
respeito.
Escrever biografias de Pete Best, Manuel Xudu, Raymond
Queneau, James Ensor, Saul Steinberg e Edvaldo do Ó.
Fotografar um disco voador voando.
Fazer seis meses de psicanálise e usar isso como pretexto
pra tudo que me der na veneta.
Pegar minhas fotos de Instagram e fazer um livrinho (só as
fotos e os títulos) do tamanho de um compacto de vinil.
Aprender a andar de bicicleta o bastante para alguém me
filmar por uns 10 ou 15 segundos, e registrar para a posteridade.
Fazer uma lista e sair ligando de pessoa em pessoa,
pedindo desculpas por desatenções que vai ver que elas nem se lembram mais.
Faxina nas gavetas. Mesmo.
Passar um dia rodando por Campina e fotografando lugares
especiais, projeto a se chamar “There are Places I Remember”.
Voltar a caminhar, a tratar dos dentes e a fazer checape.
Sair a pé de manhã de Laranjeiras rumo à Zona Norte, sem
rumo pré-estabelecido, e pegar um táxi de volta quando me sentir na lona.
Consertar meu Prêmio Jabuti que levou uma queda há três
anos e quebrou a base.
Comprar um HD externo pra copiar o HD do computador
velho.
Decorar uma dúzia de poemas meus na ponta da língua pra
não pagar mais o mico de recitar lendo.
Emoldurar as incontáveis gravuras de artistas amigos meus
que tenho em forma de canudo, deitadas por cima dos livros.
Descobrir a pedra filosofal, a quadratura do círculo e a
fonte da juventude.
Fazer uma limpeza em regra nas pastas de papéis obsoletos
(recibos de contas de luz da casa onde morei 20 anos atrás, etc.).
Escrever o último capítulo (o único que falta) daquele
livro iniciado em 2001.
Comprar um tênis e um sapato novo, tou precisando.
Praticar ioga, pilates, musculação, RPG, ginástica
aeróbica e capoeira.
Traduzir “Le Bateau Ivre” de Rimbaud e abaixar de vez a
crista da concorrência.
Inventar uma esferográfica que não deixe um borrão assim
que encosta no papel.
Botar letra naquelas 76 músicas e música naquelas 118
letras.
Prestar mais atenção aos sentimentos dos terráqueos, eles
não têm culpa de serem assim.
Levar um tiro de espingarda-doze na caixa-dos-peitos,
acender um cigarro e dizer: “Nem doeu”.