No capítulo da fala paraibana (ou nordestina), tenho
recorrido às minhas anotações para ver até que ponto certas expressões que
sempre me pareceram “nossas” são brasileiras de ponta a ponta. Ou se (caso
também possível) são nordestinas mesmo, mas as migrações e as trocas culturais
já as espalharam pelo resto do país. Aqui vão mais alguns verbetes do meu
inédito Dicionário Paraibano.
“Amarrar o cocó”. Diz-se de quando a chuva torna-se mais
forte e mais cerrada, ameaçando durar por muito mais tempo. “Eu estava pensando
em ir pra casa, mas agora a chuva amarrou o cocó e acho melhor dormir aqui
mesmo.”
“Desconfiado que só cachorro em bagageiro de bicicleta”. “Desconfiado”,
no caso, vem no sentido de “pouco à vontade, inseguro, receoso”. No Rio usa-se muito uma variante:
“Desconfiado que só cachorro que caiu da mudança.”
“Dar uma subida”. Passar uma descompostura; repreender
alguém com veemência e agressividade.
“Quando eu cheguei atrasado no primeiro dia de trabalho, o cara me deu
uma subida na frente do escritório todo, morri de vergonha.” Tem relação com a expressão “subir de tamanco”,
que tem sentido semelhante: “Com Fulano a gente tem que subir de tamanco nele
de vez em quando, senão ele bota tudo a perder.” É frequente usar complementos exagerados: “Ele subiu de tamanco e
desceu de botina em cima do porteiro, porque ele dormiu e deixou a porta
aberta.”
“Carrego (ê).” Pessoa complicada, com energia negativa, que
só atrai problemas e confusões. “Fulano
é um carrego muito grande, quando ele senta na mesa eu vou logo perguntando
quanto foi minha parte na conta”. Tem
ligação com expressões como “Aquele ambiente é muito carregado”, ou “Vou tomar
um banho de sal grosso pra descarregar”.
“Bufo-bufo”. Onomatopéia usada no futebol: é o jogo à base
de chutões para a frente e muita correria. "Eu não sei qual foi o milagre
desse técnico pra fazer o Treze baixar essa bola, o Treze sempre foi um time de
bufo-bufo."
“Até meia noite.” Modo brincalhão de confirmar uma data
perguntada por alguém. "-- Hoje é sábado?... -- Até meia-noite!"
Tem relação com o hábito de pessoas do tipo "idiotas da
objetividade", que, quando alguém diz: "O aniversário de Fulano é
amanhã", o sujeito exibe o relógio num inexplicável gesto de triunfo:
"Amanhã, não! Hoje! Já passou de meia-noite!" Reflexo da
substituição da noção natural de dia, que se inicia ao nascer do sol, pelo dia
conceitual, que se inicia à meia-noite.