(ilustração: Selin Arisoy)
H. P. Lovecraft foi um dos escritores mais influentes da
literatura de horror, que ele misturou com ficção científica para produzir uma
espécie de “horror cósmico”. Ele apregoava ser “um homem do século 18 perdido
no insuportável século 20”. Criado com certo luxo até os 14 anos, depois teve
que se adaptar a uma vida de penúria financeira, doenças na família, um casamento
fugaz, daqueles que nunca poderiam ter dado certo. Era em essência um solteirão
calado, cheio de venetas, que gostava de dar longos passeios e de ler
alfarrábios antigos. E escrevia longas cartas para colegas escritores que, em
muitos casos, nunca veio a conhecer.
A cabeça de Lovecraft, esculpida por Gahan Wilson (famoso
pelos seus cartuns de humor negro) tornou-se a materialização do World Fantasy
Award, um dos principais troféus anuais da literatura fantástica. A lista de
quem já ganhou o troféu é enorme, e inclui autores como Fritz Leiber, Gene
Wolfe, Tim Powers, Peter Straub e Jack Vance.
Acontece que Lovecraft tinha uma visão muito peculiar a
respeito de outras raças, como os negros e os judeus. Seu aristocratismo
pomposo exigia esse tipo de esnobismo, e ele parece ter acreditado, como tantos
intelectuais brasileiros da mesma época, que a mistura de raças empobreceria ambas.
Vai daí que escritores atuais, informados das idéias racistas de HPL,
questionaram o uso de sua imagem no troféu. Como se dissessem: “Esse cara é o
modelo que devemos seguir?”.
A substituição da estátua foi anunciada na entrega dos
prêmios de 2015. Uma reação imediata foi a de S. T. Joshi, biógrafo de
Lovecraft, que devolveu os troféus que já tinha ganho e disse ser tudo aquilo
“uma concessão covarde ao pior tipo de atitude politicamente correta”. Eu mesmo
fiquei pensando: Quem tem razão? Quem acha que HPL por ser grande escritor já
está anistiado? Ou quem acha que não, que preconceitos racistas devem ser
sempre denunciados e punidos, mesmo que postumamente?