Recentemente os leitores e críticos andaram comemorando
os 86 anos de Ursula K. LeGuin, para muita gente “a maior escritora de FC de
todos os tempos”. Esses títulos são meio bombásticos e pomposos, não fazem
muito o meu estilo, mas se eu tivesse que escolher apenas uma autora mulher no
gênero escolheria ela, que escreveu Os Despossuídos (1974), A Mão Esquerda
da Escuridão (1969), O Nome do Mundo é Floresta (1976), The Lathe of
Heaven (1971) – cada qual melhor do que o outro, além de dezenas de contos
brilhantes e da famosa série de fantasia (desta não li muita coisa) de Terramar
(“Earthsea”, vários volumes).
LeGuin é uma pessoa tranquila e sensata (tenho a
excelente tradução inglesa dela para o Tao Te King – o Livro do Caminho
Perfeito de Lao Tsé), uma argumentadora implacável, uma feminista ponderada e
cheia de argumentos. Filha de um antropólogo, ela trouxe para a FC da época em
que estreou um conhecimento refinado de ciências sociais e psicologia, o que
deu aos seus livros uma textura humana ausente de grande parte da FC da época,
mesmo a de melhor qualidade.
Le Guin é um dos grandes nomes de uma linha de FC
chamada justamente de “humanista”, por ser uma literatura onde a tecnologia
está presente de forma crucial, mas em segundo plano. O primeiro plano é
ocupado pelos conflitos e aventuras de indivíduos em situações sociais muito
claras, e muitas vezes com profundas discussões e questionamentos sobre
questões de gênero, raça, ideologia, classe social, etc. Seria (para usar a
expressão brincalhona atual) uma “ficção científica de Humanas”, e envolve
autores como ela, Kim Stanley Robinson, Frank Herbert, Ray Bradbury, Samuel R.
Delany, Walter M Miller e muitos outros.