Zuza Homem de Melo e Jairo Severiano comentam (A Canção no Tempo, Ed. 34, 1998) que certa vez o compositor Pedro Caetano foi abordado numa festa por uma moça que pediu: “Faça uma música pra mim!”. Ele descobriu que ela se chamava Maria Madalena de Assunção Pereira, e achou que o nome tinha uma cadência favorável. O resultado foi uma canção que dizia: “Maria Madalena de Assunção Pereira / teu beijo tem aroma de botões de laranjeira...”
Tudo muito bom, tudo muito bem, mas estava-se nos anos 1940,
em pleno Estado Novo. O mundo estava em guerra, a ditadura de Vargas começava a
balançar, mas quando Ciro Monteiro começou a cantar a música nos programas de
rádio surgiu o problema: “A censura proibia nomes próprios por extenso em
letras de música, alegando que isso afetava a privacidade das pessoas”. E olha
que o pedido da música partiu da própria moça! A solução, antes que a canção
fosse gravada, foi trocar o nome da moça pelo que foi gravado e ficou famoso:
“Maria Madalena dos Anzóis Pereira”.
Políticos são muito citados na MPB, e o recorde deve
pertencer a Getúlio e JK. Nomes de gente de verdade aparecem aqui e acolá, mas
sempre na forma incompleta: “Domingo lá na casa do Vavá / teve um tremendo
pagode que você não pode imaginar... / Provei do famoso feijão da Vicentina...”
(Paulinho da Viola); “Ô Antonico, vim lhe pedir um favor que só depende da sua
boa vontade / é necessário uma viração pro Nestor...” (Ismael Silva); “Marcolino
dava tudo por um cheiro de Xandu” (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira).
Uma exceção é a “Festa da Arromba” gravada por Erasmo
Carlos, onde se nomeia praticamente toda a Jovem Guarda da época. (Acho que o
problema de privacidade a essa altura já tinha ido pro espaço.) E o exemplo
mais notório da MPB é o da “Língua”, de Caetano Veloso, onde ele homenageia
pessoas com nomes fora do comum: “Scarlet Moon de Chevalier / Glauco Mattoso e
Arrigo Barnabé!”. Dos três, apenas o de Glauco é pseudônimo, mas como se trata
do nome público usado pelo poeta maldito do Jornal Dobrabil, vale a mesma
questão: isso interfere na privacidade da pessoa?