(ilustração: Virgil Finlay)
Traduzi há pouco tempo, para uma antologia a sair pela
Editora Poetisa (Santa Catarina) o conto “The Color Out of Space”, de H. P.
Lovecraft. Os meus contos favoritos dele
são “O Chamado de Cthulhu” e “The Shadow Out of Time”, que me produziram os
impactos iniciais, aqueles contos em que pela primeira vez entramos em contato
com o universo e a imaginação de um autor. Mas “A Cor que Caiu do Espaço”,
destrinchada linha por linha, é uma história que reúne “espíritos” de
diferentes gêneros. Tem algo dos “tall tales” rurais, as histórias dos matutos
a respeito de acontecimentos insólitos em seu interiorzinho pacato. Tem algo dos
contos de FC que descrevem a chegada à Terra de alguma presença maligna. Tem
algo dos contos góticos sobre uma sucessão de mortes inexplicáveis concentradas
num grupo de pessoas, ou num local. Tem
algo daqueles contos cruéis em que coisas ruins acontecem a pessoas boas, e a
única justificativa para isso é que o Universo nos vê com indiferença, ou,
melhor dito, não nos vê.
Um meteoro cai sobre uma fazenda e sua substância misteriosa
contamina ou mata tudo em redor, a água, a vegetação, os animais. E tudo
adquire uma coloração que nunca havia sido vista pelo homem. A monstruosidade
daquilo, segundo Lovecraft, não está na biologia de uma criatura, e sim na cor.
Nas suas cartas desse ano (1927) HPL diz que se trata mais de um “estudo de
atmosfera” do que de um conto, e tem razão. O destino dos personagens é
previsível, mas o horror brota da cegueira deles em admitir o que lhes está
acontecendo até que seja tarde demais, somente porque é algo que não têm como
explicar.
É um ser semi-gasoso, reconhecível pela sua cor, uma cor
nova, como o “flicts” cuja existência as câmeras da Nasa captaram na Lua e
Ziraldo oficializou em livro. O que nos obriga a lembrar de outro famoso conto,
desta vez de Ambrose Bierce (o criador de “Carcosa” e autor do Dicionário do
Diabo), “The Damned Thing”, outra “história de fronteira” sobre um ser que não
pode ser visto (mesmo quando está atacando e despedaçando um homem) porque sua
cor não pode ser captada pelo olho humano.