Lendo uma entrevista do jornalista Sérgio Augusto no suplemento Cândido (Curitiba-PR), li um parágrafo que me alegrou e me constrangeu, quando ele fala do uso insuportável de clichês nas matérias de jornal e revista. Diz ele:
“Para ganhar tempo, paro de ler de imediato qualquer texto com clichês e expressões que abomino. De imediato, mesmo, ainda que o assunto me esteja interessando. É minha forma de protestar em silêncio contra o insulto que a meu ver representam coisas do tipo ‘resgatar a memória’, ‘conquistar corações e mentes’, ‘ícone’ disso e daquilo, ‘emblemático’, e por aí vai, o glossário não para de crescer. Com a internet e seu vale-tudo vernacular, sintático e estilístico, esse descalabro atingiu culminâncias inéditas. Há blogs que, só de olhar, me provocam engulhos, com seus pontos de exclamação torrenciais, suas palavras ‘gritadas’ em caixa alta, seu gosto por hipérboles do tipo ‘o máximo’, ‘genial’, ‘imperdível’.”
Fiquei alegre porque concordo, e constrangido porque uso
alguma dessas besteiras. São as filhas da pressa e da palavra impressa. Vemos
uma frase repetida dia e noite, noite e dia, em jornal, em livro, em TV, em
rádio, em papos ao vivo... Aquilo se instala em nossa memória por mero peso
estatístico. Quando tentamos dizer alguma coisa parecida, nossa memória age
como um Google e nos traz “a mais frequente, a mais acessada”. Aí a gente
escreve coisas do tipo: “O novo livro de Fulano de Tal me deu um prazer
inenarrável”.
O clichê nunca é uma simplificação, é sempre uma enfeitação
de uma idéia. Como tantas enfeitações,
no momento em que aparece produz um susto-de-novidade que pode passar como uma
comunicação mais intensa. O leitor
percebe aquela expressão que nunca viu na vida: “Resgatar a memória”. Que coisa
profunda: a nossa memória, a nossa História foi sequestrada, e estamos
invadindo o território inimigo, pegando-a de volta na marra, como é nosso
direito, etc. Depois da décima vez, no
entanto (e pra isso bastam alguns meses depois da primeira vez), quem aguenta
mais ouvir o clichê? Deixou de dizer. Virou uma expressão coringa, sem
informação própria, e que está ali meio que guardando lugar para a próxima
expressão criativa que alguém vier a produzir.