(cartum de Samuel)
A frase me surgiu de improviso ao discutir uma questão
inesperada: “Tradutores, uni-vos! Sem a gente não existia esse livro!”. Não se pense que estou conclamando multidões
à rua; basta me conhecer para saber da impossibilidade científica de tal
evento. Melhor trazer outra explicação.
O “uni-vos” não quer dizer que tenham de sair à meia-noite de archote em
punho ou que conquistem praças, esquadras e palácios à frente de um milhão de mujiques.
Uma forma de união seria tornar mais frequente e mais pública a discussão das
traduções e de suas dificuldades, até mesmo para que o público leitor
entendesse o que é de fato uma tradução. (Muita gente ainda pensa que tradução
é como exercício de caligrafia: já está tudo feito, e ganha nota boa quem fizer
mais parecido com o original.)
OK, creio que existem fóruns de tradutores, portais de
debates, de trocação de figurinhas e de lavação de roupa suja, mas o leitor em
geral fica alheio a esses conciliábulos. As editoras, principalmente as que
lidam com os clássicos (livros com numerosas versões) bem que poderiam
desembolsar uns caraminguás extras, e contribuir para que os leitores lessem
melhor. E comprassem melhor.
Uma das vantagens do texto eletrônico-digital é a
possibilidade de expandir e contrair grande quantidade de texto. Podia haver
uma espécie de meta-edição de clássicos em que algumas partes mais importantes
ou mais obscuras pudessem, a um comando de link ou de toque, abrir janelas
laterais com um certo número de traduções para vários idiomas, cada uma delas
comentada, justificada, de modo a ser proveitosa a quem não soubesse o idioma
original. Poderíamos ter, por inevitável exemplo, o Ulisses de Joyce em
inglês, e a cada passo poderíamos ler um parágrafo do original tendo ao lado
janelinhas com as respectivas traduções de Antonio Houaiss, Bernardina Pinheiro
e Caetano Galindo.