Li num websaite a respeito da série Game of Thrones, ambientada num continente chamado Westeros, que não tem nada em comum com a nossa Terra. Não há nesse gigantesco épico planetário um só nome próprio que aluda às culturas da Terra, às religiões da Terra, às civilizações da Terra, à geografia da Terra. Os nomes, mesmos compreensivelmente dóceis às formas ocidentais de pronunciar, são nomes sem história terrestre. (Se bem que muitos dos sobrenomes, desde Stark até Tyrell, são bem americanozinhos.)
Os fãs discutem a propriedade ou não das armas e das táticas
de batalhas. (Isto é uma qualidade inerente ao ofício da guerra, ou é apenas um
cacoete herdado de videogames onde “items”, etc são entesourados?) Discutem os deuses (eles têm uma religião
baseada no Sete, e não na Trindade, como nós), os idiomas (o domínio seguro de
um idioma estrangeiro, ou a ausência disso, surge em momentos cruciais desta
história). A certa altura (foi o que li), alguém questionou: “Eles dizem que
comem carne com batatas. Ora, batatas não pertencem á Europa. A batata é da
América. Como eles poderiam conhecer a batata, no grau de evolução tecnológica
em que aparentam estar?” E o autor do
artigo comenta: “Peraí, pessoal. Os
caras estão escrevendo uma história com dragões, e vocês questionam a
verossimilhança da batata?”.
Alguém diria que é em momentos assim que se dá a bifurcação
entre quem gosta de ficção científica “hard” (o que cobra rigor nas batatas) e
quem gosta de fantasia (para quem está tudo muito bem, desde que pareça fazer
sentido). Pra mim, não se trata de dois
gêneros diferentes (embora estes existam), trata-se de duas mentalidades. Os que veem uma história como um mecanismo
onde tudo tem que se ajustar e precisa de justificativa; e os que veem uma
história como uma reprodução de algo que acontece na vida.