A morte de Garcia Márquez me deu aquela tristeza de saber que nunca mais ouvirei falar sobre “o mais novo livro de Garcia Márquez”. Geralmente, compenso esse efeito melancólico com a lembrança de que não li a maior parte do que o autor escreveu, então, bem ou mal, quando eu pegar para ler O veneno da madrugada ou Doze contos peregrinos é como se fosse um livro com a tinta ainda úmida.
Fui dar uma relida nos textos dele online e me bati com um
pequeno mistério, que aproveito para dividir.
GGM tem um continho curto que é uma beleza, “A última viagem do navio
fantasma”, um daqueles contos de parágrafo único que nos arrebatam da primeira
à última palavra e se transformam numa pequena epifania literária. É a história
de um menino num povoado à beira-mar que vê passar um navio fantasma (que
somente ele vê) o qual acaba afundando; isso se repete todo ano, na mesma data,
e ele pensa que é a reconstituição sobrenatural de um fato ocorrido num passado
remoto.
Não tirarei de ninguém o prazer da leitura dessa joiazinha
de apenas 2 mil palavras (dá mais ou menos a extensão de 4 artigos como este),
num fluxo de imagens que aqui lembram Ray Bradbury, ali Mario Quintana, mais
adiante Marc Chagall ou Fellini. No final (que não revelarei), o menino tem um vislumbre do nome do
navio, quando o descreve: “...veinte veces más alto que la torre y como noventa
y siete veces más largo que el pueblo, con el nombre grabado en letras de
hierro, balalcsillag...”.
Nome esquisito, que parece inventado, não é mesmo? Mas hoje temos São Google, em cujo altar dou
minhas clicadas cotidianas. Lá vou eu perguntar pelo nome. Praticamente todas
as respostas se reportam ao conto de Márquez, que é reproduzido mundo afora em
várias línguas. Mas no alto da página o Google faz aquela ressalvazinha
robótica de sempre: “Você quis dizer ‘halálcsillag?”. Era tão parecido que eu
cliquei, pensando, “sim, digamos que foi isso mesmo”.