Ainda sobre a questão do título de um livro (ou de uma obra de outra natureza, mas que comporte um título): sua escolha deveria ser objeto das mesmas discussões madrugada adentro que os casais geralmente fazem para escolher o nome de um bebê. Com um fator de dificultação a mais, porque o nome do bebê basta ser interessante e agradável, não tem a obrigação de condensar a essência do bebê (que nem existência tem ainda, coitado, quanto mais isso), ao passo que título de livro precisa ser tão elucidativo quanto um nome próprio, tão personalizado quanto uma impressão digital e tão expressivo quanto um rosto.
No blog de Marcelino Freire “Ossos do Ofídio” (http://bit.ly/N2DOm8) li uma divertida
discussão de Clarice Lispector com dois colegas. Ela queria intitular um livro
seu A veia no pulso. Fernando Sabino foi contra, porque achou que o título
sugeria Aveia no pulso. João Cabral disse que o título era ótimo, que não se
tratava de um cacófato, e que as veias e o pulso são coisas que a mente associa
uma à outra sem muito esforço, de modo que só um idiota entenderia errado.
Aliás, o livro acabou se chamando A Maçã no Escuro – muito melhor, pelo meu
gosto.
O jovem romancista perseguia o escritor veterano e
enchia-lhe o saco pedindo sugestão de título para um romance. Um dia o cara se
encheu e disse: Me diga uma coisa. Aparece algum tambor no seu livro? O rapaz:
Não, não aparece. Ele: Bom. Tem alguma
corneta? O rapaz: Claro que não! Ele: Então está aí seu título: Sem Tambor nem
Corneta!
Esse tipo de definição por exclusão lembra o
conselho de Mark Twain de que sempre que se fosse criar uma biblioteca a
primeira coisa a fazer seria não comprar os livros de Jane Austen. “Mesmo que
nenhuma outra obra venha a ser comprada,” dizia Twain, “só pelo fato de não ter
nenhum livro dessa senhora já será uma excelente biblioteca”.