No fim de
semana passado, fiz uma coisa que só acontece raramente na vida da gente:
realizar um sonho de quarenta anos, e ainda ganhar para isso! O “ainda ganhar” se deve ao fato de que
viajei a trabalho, como parte da equipe do documentário Bom dia, poeta, que
incluía Alexandre Alencar (direção), Amaro Filho e Cláudia Moraes (produção),
Ivanildo Marques e Chapola Silva (fotografia e som). Eu fui como roteirista e
entrevistador, além de poeta nas horas vagas.
O sonho de
40 anos foi conhecer São José do Egito, que o pessoal chama (com certa
discrepância geográfica) “a Meca da poesia popular nordestina”. Sem a
grandiosidade da Kaaba ou das Pirâmides, São José é uma cidade de 30 mil
habitantes que respira poesia como Florença respira artes plásticas ou Nova
Orleans respira jazz. Está na essência, na medula daquele povo; está no seu
jeito de ser, de falar, de pensar, de interpretar o mundo e de estabelecer seus
laços recíprocos de amizade e admiração. No mundo da poesia popular, chamamos
de poeta (“bom dia, poeta!”) as pessoas de quem gostamos, que admiramos, que
desejamos honrar e tratar bem. Nem todos são poetas, é claro, mas um bom leitor
de poesia é mais importante do que duzentos poetas ruins.
A Festa de
Rei era a comemoração dos 99 anos de nascimento de Lourival Batista, “Louro”
(1915-1992), e um ensaio para a festa do seu centenário no ano que vem. Louro,
com quem convivi entre 1975 e 1980, formou, com seus irmãos Otacílio e Dimas, a
trinca dos irmãos Batista Patriota, três rochedos imbatíveis contra os quais
oceanos inteiros de versos alheios se espatifaram inutilmente. Cada um com suas
características; o forte de Louro era o trocadilho, a construção sinuosa e
impecável de glosas que entraram para a História, o espírito escarninho e
mordaz (principalmente nos desafios com seu grande amigo Pinto do Monteiro), e
a alma de poeta, sem vaidade, sem egoísmos. Criou uma família enorme, cheia de
artistas, muitos dos quais se revezaram no palco armado em homenagem ao mestre
nos dias 4, 5 e 6 deste janeiro.