Circula a notícia de que a PM carioca sugere a criação de um Manifestódromo onde venham a se concentrar os novos protestos populares, que estão causando transtorno à cidade. É como se dissessem: “Um milhão de pessoas uma vez por ano, tudo bem, mas 500 gatos pingados todo dia não pode!”.
Há um paradoxo curioso e talvez insolúvel na criação de um
espaço delimitado e oficial para protestos públicos. Tudo que os governos e as
autoridades querem é controlar esses protestos, dizer o que pode, o que não
pode, como vai ser, como não vai. O governo quer ser o coreógrafo do protesto,
o carnavalesco da manifestação. Demarcar um lugar, estabelecer um horário (“é
permitido protestar aqui das 6 às 8 e meia...”), disciplinar a produção sonora
(“bater latas pode, soltar fogos não”), gravar e filmar quem entra e quem
sai... Qualquer governo fará o possível para conseguir isso.
Por outro lado, tudo que manifestantes, protestadores,
anarquistas, baderneiros, vândalos e rebeldes em geral querem é justamente não
se deixarem controlar dessa forma. Para eles, liberdade concedida não é
liberdade, protesto consentido não é protesto, revolta autorizada não é
revolta. E têm razão, não é mesmo? Talvez o resultado prático traga
contratempos para todo mundo, inclusive para mim (que fico preso no
engarrafamento) mas filosoficamente não posso contestá-los.
Tudo que termina em “ódromo” fica com um cheiro de coisa
fake, coisa falsificada, marca de fantasia. Não sei se foram Brizola e Darcy
Ribeiro que batizaram com esse nome o Sambódromo carioca (foi Darcy, com
certeza, quem criou a expressão “Praça da Apoteose”). O modelo, claro, foi o
Autódromo de Jacarepaguá; durante a construção da Passarela do Samba, o termo
“sambódromo” surgiu na imprensa e acabou pegando. Logo depois, veio o
Camelódromo da Rua uruguaiana, para onde foram recambiados todos os camelôs e
ambulantes que transformavam o centro do Rio num enorme mafuá. Hoje, o
Camelódromo funciona que é uma beleza, vive cheio de gente, é um dos lugares
mais tupinipunks do Rio de Janeiro, e o centro está virando o mesmo mafuá de
antigamente.