sábado, 1 de junho de 2013

3201) Títulos traduzidos (1.6.2013)





Anos atrás li uma entrevista com o funcionário de uma distribuidora de filmes, tipo Columbia ou Franco-Brasileira, argumentando sobre as escolhas de títulos brasileiros para os filmes que vêm de fora. Todo mundo se queixa da nossa infidelidade aos títulos nacionais, sempre achando que além da infidelidade há uma perda de qualidade. O tal funcionário defendia-se da melhor forma possível. Dizia ele que, título por título, ninguém sairia de casa para ver um filme chamado A linha fina, mas veria com interesse Uma vida em suspense (é o filme em que Anne Bancroft toma comprimidos para se matar e Sidney Poitier, no serviço de suporte psicológico, a mantém acordada ao telefone, enquanto a ambulância chega. A linha fina, The Slender Thread, é o fio do telefone). O objetivo do título não é descrever ou sintetizar o filme, é atrair o espectador.

E o título tem uma poesia própria. Tiro meu chapéu para quem inventou, para filmes estrangeiros, expressões em português que se incorporaram a nossa linguagem, como Assim Caminha a Humanidade (Giant), Um Corpo que Cai (Vertigo), O Pecado Mora ao Lado (The Seven Year Itch), Suplício de uma Saudade (Love is a Many Splendored Thing), Os Brutos Também Amam (Shane), etc. Alguns títulos parecem meio ridículos até fazerem sucesso, como A Noviça Rebelde, e o fato é que um musical chamado O Som da Música não pareceria algo muito promissor. O mesmo vale para outro filme de Robert Wise, Amor Sublime Amor, porque História do Lado Oeste pareceria um documentário do canal NatGeo. Já o recorde de fidelidade, claro, é Down By Law de Jim Jarmusch, que em português virou Daunbailó.

Um título, dizem os funcionários de distribuidoras, tem que ser chamativo, e o que é chamativo numa cultura ou num idioma pode não ser no outro. Nas redações de jornal, geralmente é o editor, não o redator da matéria, quem dá o título. O redator pode até sugerir e a sugestão ser aceita; mas a decisão do título é tomada um nível acima. Por que? Porque é uma decisão estratégica, exige a visão do conjunto. O título (a manchete) tem que se adequar à matéria mas também à página onde a matéria vai aparecer. Na mesma página não pode haver dois títulos semelhantes. O título é uma isca e um anzol juntos. É ele quem determina se a matéria vai ser começada-a-ler; depois do primeiro parágrafo o texto tem que se defender sozinho. No caso do filme, é mais confortável. O título influencia a ida à bilheteria e a compra do ingresso. Depois disso... Nunca vi ninguém se levantar no meio da sessão e sair protestando: “Mas essa história não corresponde ao título do filme!”.