Quem
lê meus artigos ou me conhece pessoalmente, sabe duas coisas a meu respeito: 1)
Eu sou agnóstico, não acredito na existência de um Deus nem de uma alma humana
imortal; 2) Eu não me importo que outras pessoas acreditem nisso, desde que
essa crença as torne pessoas melhores e não prejudique os demais. Acho a
religião uma coisa importante, mas para mim (para MIM, pessoal e
intransferivelmente) a Ciência fornece explicações mais sensatas sobre o Universo,
o mundo e o ser humano. “Ah, mas há milhões de coisas no mundo que a Ciência
não explica!”. É verdade, mas, e daí? O mundo é novo, minha gente! A Ciência
mal começou!
O
Brasil é uma República onde todo mundo (pelo menos no papel) tem os mesmos
direitos, e que não dá preferência a uma religião sobre as demais. Dar
precedência jurídica a qualquer grupo religioso – essa coisa tão subjetiva, tão
alicerçada na fé, tão de-foro-íntimo, tão pessoal-e-intransferível –
equivaleria a dar poder legislativo a um teoria estética sobre as demais. Permitir,
por exemplo, que um gênero literário (ou um ritmo musical, ou um movimento
teatral, etc.) tivesse o poder de bloquear todos os apoios governamentais aos
outros. Ia ser muito engraçado ver ensaios intitulados – “O Declínio do Romance
Realista Urbano no Brasil: Uma Ditadura da Ficção Científica?”.
Religião
é uma coisa parecida com a Arte. Não se baseia em verdades universais, mas em crenças
pessoais, acreditadas e disseminadas de início por pequenos grupos, que vão se
ampliando à medida que ganham adeptos, mas que, em última análise, não têm o
direito de impor sua visão sobre os demais. Não há provas consensuais de que
qualquer um desses deuses (Deus, Iavé, Allah, Shiva, etc.) exista, assim como
não há provas consensuais de que Picasso seja um bom pintor, Glauber Rocha um
bom cineasta, H. G. Wells um bom escritor ou Pinto do Monteiro um bom
repentista.
Não
há como avaliar isso de modo imparcial, objetivo, distanciado. Arte e religião
são certezas íntimas cultivadas por pessoas, e merecem o maior respeito. Pelo respeito
que merecem, precisam ser deixadas de fora da atividade legislativa e jurídica:
porque todas precisam ser levadas igualmente a sério, o que significa que
nenhuma delas tem o direito de se sobrepor juridicamente às demais. O Estado
brasileiro tem que ser laico em matéria de religião, como garantia de que todas
as religiões terão livre curso para suas atividades; e que todas as formas de
arte serão igualmente livres para criar.