Neste
filme dirigido (e interpretado) em 1962 por Ray Milland, um homem, sua esposa e
o casal de filhos (na faixa dos 20 anos) estão na estrada com seu trailer rumo
a umas férias na montanha quando veem de longe Los Angeles ser destruída por
uma explosão atômica. As estradas ficam engarrafadas de carros em fuga, e
começa uma luta desesperada pelos gêneros de primeira necessidade, e depois
pela sobrevivência pura e simples, pois a Lei da Selva começa a se impor. Milland
é um sujeito pacato de cujo passado nada sabemos (sequer sua profissão), mas
uma das primeiras coisas que faz é comprar armas e afirmar que ninguém vai
fazer mal à família dele. Nisto me lembrou muito o Walter White de Breaking
Bad, para quem o argumento “estou defendendo minha família” justifica a priori
qualquer transgressão, qualquer violência.
Eles
se refugiam nas montanhas, abrigados numa caverna onde tentam simbolicamente
recomeçar “do zero” a civilização. Arrumam a gruta com mesinha, cadeiras, etc.,
e dedicam-se à caça e às tarefas domésticas. Mas a Lei da Selva os persegue na
pessoa de três jovens suspeitamente parecidos com os companheiros de James Dean
em Juventude Transviada – rapazes que querem apenas assaltar, estuprar e
divertir-se enquanto o mundo não acaba.
Milland
faz um personagem complexo, porque adere com rapidez à violência (ao comprar as
armas, por falta do dinheiro completo acaba assaltando o lojista), mas
repreende com aspereza o filho que demonstrou prazer ao atirar num inimigo.
Diz-lhe que ele tem o direito de matar alguém por auto-defesa, mas que não deve
gostar daquilo.
A SF Encyclopedia informa que o filme se baseia (sem dar crédito) em dois
contos de Ward Moore (publicados em 1953 e 54 na revista Fantasy & SF),
intitulados “Lot” e “Lot’s daughter”. Há um certo paralelo com a história
bíblica (os estranhos querendo estuprar a filha; a esposa que “olha para trás”
e quer voltar para a cidade destruída). Roubo,
violência, assassinato a sangue-frio – o pai de família não recua diante de
nada para proteger ou vingar a honra da família. Não sabemos quem atacou os EUA
com bombas nucleares; sabemos que as grandes capitais do mundo foram
atomizadas, que aquele ano foi denominado pela ONU “Ano Zero”, mas que a certa
altura as conversações de paz chegam a um acordo. Os inimigos, na verdade, são
os próprios norte-americanos. A certa altura, um médico se queixa de que as
ruas estão cheias de patriotas matando e estuprando. É um pesadelo da Guerra
Fria, e mesmo que as cenas de violência (tiros, socos, etc.) pareçam
estranhamente ingênuas hoje, a transformação gradual dos personagens mantém o
seu teor de ameaça.