terça-feira, 3 de novembro de 2009

1345) Um título é sempre uma promessa (6.7.2007)



(Jacques Derrida)

Jacques Derrida dizia que “um título é sempre uma promessa”. (Não quero botar pose de leitor de Derrida: li a citação num livro de outro cara.) Isto é interessante porque o Papa da Teoria da Desconstrução é um desses filósofos que desconfiam de tudo, que levantam o tapete em todas as salas, que olham qualquer frase contra a luz para ver se é falsificada. 

Que ele chame a algo uma promessa é uma declaração de confiança implícita, de concessão momentânea à fé.

É fácil concordar com isto quando pegamos livros intitulados Guia Prático da Tradução Inglesa ou A Vida de Napoleão. Títulos assim são auto-explicativos, não nos permitem muita dúvida, além de serem de uma concisão admirável. 

Chegamos a um alto grau de síntese se nos compararmos aos nossos colegas do século 18. Diz-se que o primeiro livro impresso no Brasil intitulava-se Relação da Entrada que fez o Excelentíssimo, e Reverendíssimo Senhor D. Fr. Antonio do Desterro Malheyro, Bispo do Rio de Janeiro, em o primeiro dia deste presente Anno de 1747, havendo sido seis Annos Bispo do Reyno de Angola, donde por nomiação de sua Magestade, e Bulla Pontificia, foy promovido para esta Diocesi

O título já diz tudo. Parece aquela parábola de Borges sobre um país onde a Cartografia estava tão avançada que o mapa de um Estado era do tamanho do próprio Estado.

O escritor Carlos Emílio Corrêa Lima sugeriu certa vez que o livro mais borgiano seria um que se limitasse a enumerar títulos de livros imaginários. A tarefa parece desnecessária, porque catálogos de editoras e de livrarias fazem chover sobre nós, sem parar, títulos magníficos que jamais se transformarão para nós em livros, pela simples razão de que não teremos tempo de vida bastante para ler todos.

Dizem que a trilogia O Tempo e o Vento de Érico Veríssimo iria se chamar O Vento e o Tempo, e só em cima da hora de ir para a gráfica o autor fez a mudança final. (Podem achar bobagem, mas eu acho que melhorou 100%.) 

O mesmo com Vidas Secas de Graciliano Ramos, que em estágios sucessivos de sua preparação esteve para se chamar “O Mundo Cheio de Penas” (uma frase desgraciosa e confusa) ou “Baleia” (dando excessiva ênfase a um personagem menor). Na hora de ir para a gráfica, a sabedoria instintiva do autor falou mais alto.

Um belo título é uma fonte de maravilha eterna. 

À Sombra das Raparigas em Flor 
A Lua vem da Ásia 
Notas de Manfredo Rangel, Repórter, a Respeito de Kramer 
Os Frutos Dourados do Sol
O Jardim das Veredas que se Bifurcam 
Perto do Coração Selvagem 
A Sombra do Arco-Íris 
Será que os Andróides Sonham com Carneiros Elétricos?
Se um Viajante numa Noite de Inverno 
Apontamentos de História Sobrenatural 
O Clube dos Valetes de Copas 
Os Morcegos Estão Comendo os Mamãos Maduros 
O Círculo de Giz Caucasiano 
A Noiva Estava de Preto 
A Volta ao Dia em Oitenta Mundos 
Riverão Sussuarana...